Sociedade

O imenso silêncio no centenário de Hélio Pellegrino

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Em 5 de janeiro de 2024 aconteceu o centenário do psicanalista mineiro Hélio Pellegrino. Nenhuma matéria na imprensa brasileira. Nenhuma nota. Nem mesmo nos jornais da sua cidade natal, Belo Horizonte. Muito menos na sua cidade de escolha, Rio de Janeiro, onde passou a maior parte da sua vida. O que isso significa? Que ele foi um poeta menor, com apenas um livro póstumo? Ou um cronista/ensaísta mediano, indigno de crédito? O que será? O que seria? Não há nada a se dizer?

Sim, há. O seu legado poético tem que ser resgatado. Não basta a publicação do “Minérios Domados” (Ed. Rocco) carpintaria delicada feita por Humberto Werneck nos seus guardados. Há mais poesia escondida no baú. O legado de textos em prosa, publicados em jornal é um importante arcabouço. Por obra e graça da seleção de cartas, poemas e artigos, feita por Antônia Pellegrino, existe o livro “Lucidez Embriagada”.  E a sua quixotesca luta contra os barões da Sociedade Psicanalítica produziu memoráveis textos ensaísticos. Cabe aos herdeiros remexer neste baú e provocar a mágica da ressurreição de Hélio Pellegrino. E sem esquecer do precioso perfil biográfico do psicanalista escritor por Paulo Roberto Pires (“A Paixão Indignada”, Ed. Relume Dumará).

Neste campo, ele se declarava católico praticante e marxista convicto. Assim, dizia, aos brados, com aqueles braços imensos e olhos faiscantes, que acreditava mesmo é na Ressureição da Carne. “Eu acredito é na Ressurreição da Carne” – repetia. Era este o seu bordão contra a morte: queria voltar reencarnado no próprio corpo, exatamente como ele foi. Não só a alma o acompanharia – o corpo também.

No campo das ideias, o silêncio da imprensa reflete o pior dos mundos: a indiferença pela ausência dos intelectuais na Política. As intrincadas razões desta retirada têm a ponta do novelo muito clara: a tortura. Cumprindo à risca as determinações de Golbery do Couto e Silva, os artistas e os intelectuais foram tão perseguidos quanto os ativistas. Mas aqui é necessário dizer que muitos eram professores-jornalistas-escritores-músicos-poetas e – ativistas clandestinos. Por isso o foco, por isso a necessidade imperial de exclui-los do campo político, do campo da discussão das ideias. Afinal, como bem disse Nietzsche, “as ideias são forças”.

E Hélio Pellegrino era destes, da turma dos insubstituíveis. Ficou preso com Zuenir Ventura, foi solto sob a intervenção de Nelson Rodrigues – história que Zuenir conta muito bem. Foi orador da Passeata dos Cem Mil. Foi fundador do Partidos dos Trabalhadores. Foi um pensador. Um homem com tal carisma que tornou sua fala inesquecível. Quem já o ouviu discursar não esquece.

O resultado está posto: a Política sem os intelectuais fica sem humanidade. Política sem Arte é apenas uma planilha de Excel. Números sem alma. Sem Hélio Pellegrino e seus olhos repletos de paixão por um País novo e, como ele, inesquecível. Hoje deveríamos dizer: “Hélio Pellegrino, Presente!”. Ele iria gostar.

Fonte da matéria: Mondolivro | Portal de Afonso Borges – https://mondolivro.com.br/o-imenso-silencio-no-centenario-de-helio-pellegrino/

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