Salomão Barros Ximenes – Em SP, políticos e banqueiros forjam ensaio clínico com o futuro dos estudantes.
Novo contrato de Parceria Público-Privada da Secretaria de Educação estabelece relação pública perde-perde, perdem os “estudantes-cobaia”, perdem os “estudantes-placebo”, perde o Estado imobilizado por 4 anos em sua atuação precípua em escolas prioritárias. Só não perdem os ganhadores de sempre, os banqueiros e suas assessorias educacionais.
O FATO
A Secretaria de Educação de SP (SEE) abriu consulta pública sobre uma proposta de privatização parcial da gestão pedagógica de 122 escolas da Capital, o chamado “Contrato de Impacto Social”, na prática uma modalidade de PPP que tem a novidade de fazer nossos estudantes de cobaias de experimentos empresariais.
A proposta de Contrato de Impacto Social (CIS) foi pensada por uma coalização formada por BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento), Banco Mundial, a ONG britânica Social Finance e o Insper, este com o braço de consultorias Insper Metricis, além da SEE. Seu objetivo é contratar pessoa jurídica com ou sem finalidade lucrativa que, ao final dos quase 4 anos de implementação, reduza em 7% a reprovação nas 61 escolas contempladas, sem redução da nota no Saresp, em comparação com outras 61 escolas de perfil semelhante que comporão o “grupo de controle”, todas do município de São Paulo. O grupo de controle, como mandam os manuais de metodologia, não sofrerá intervenção nenhuma, nada visando sua melhoria, tudo para que não se perder a “amostra”.
A empresa será paga por resultados intermediários (25% em cada avaliação de progresso) e final (50% do valor), podendo receber até R$ 17,7 milhões pelo serviço. Na equipe de trabalho sugerida no Edital, consta, além da estrutura de administração e coordenação do projeto, a contratação terceirizada de um 4 coordenadores pedagógicos e 61 educadores para as escolas contempladas, que serão os responsáveis pela implementação do programa, estes últimos com salário sugerido de R$ 2 mil.
Para participar da concorrência a empresa deve comprovar o “bom desempenho anterior na gestão de serviços educacionais na educação básica que tenham envolvido 5.400 (cinco mil e quatrocentos) alunos”, ou seja, tem que ser do ramo de venda de serviços educacionais, e um capital mínimo de R$ 1,7 milhão, podendo, uma vez aprovada, subcontratar boa parte dos serviços a serem ofertados. Vale especialmente compilar a parte do Termo de Referência que trata do Público-Alvo:
“4. PÚBLICO-ALVO: O público-alvo do projeto é composto de estudantes de ensino médio regular de escolas estaduais em áreas de vulnerabilidade na região metropolitana da cidade São Paulo. De um grupo de 122 escolas, metade (61) será selecionada para receber as intervenções (“grupo de tratamento”), ao passo que a outra metade (61) será utilizada como grupo de comparação (“grupo de controle”). O processo de seleção das escolas é feito a partir do método exposto no Adendo A a este Termo de Referência).
Destaca-se que a divisão das escolas em grupos de “tratamento” e “controle” permitirá a medição do real impacto das intervenções nas escolas que a receberam, possibilitando condicionar o pagamento aos resultados delas decorrentes.”
COBAIAS ESCOLARES
Com o contrato o Estado de São Paulo adotará metodologia de avaliação de impacto como meio de implementação de uma política pública educacional, deliberadamente, excluindo metade dos estudantes de qualquer benefício. Contratualiza melhorias para 61 escolas em situação de vulnerabilidade e programa omissão total quanto às 61 escolas do grupo de controle.
E se o Estado decidisse assegurar às escolas do grupo de controle iguais condições na “disputa”? E se investisse em seus projetos de desenvolvimento político-pedagógicos, nas melhorias das condições de gestão, igualmente com a contratação de supervisores e educadores adicionais que trabalhariam para reduzir a reprovação e a evasão? Estaria o Estado violando o contrato, interferindo no “grupo de controle”, no “placebo”?
Só uma mentalidade tecnocrática obtusa pode desconsiderar a gravidade que é leiloar as vidas de milhares de estudantes, tornados cobaias de institutos empresariais e bancos. Além de ilegal e imoral é sinal dos tempos em que proliferam nas políticas educacionais as consultorias privadas de todo tipo, aliadas ao amadorismo e à permissividade dos gestores de plantão.
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