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Nobel de Medicina vai para descobertas sobre relógio biológico

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Fábio de Castro – Os americanos Jeffrey Hall, Michael Rosbash e Michael Young desvendaram os mecanismos moleculares que controlam os ritmos circadianos, explicando assim como plantas, animais e humanos sincronizam seu ciclo biológico à rotação do planeta

Os vencedores do Prêmio Nobel de Fisiologia ou Medicina de 2017 são os americanos Jeffrey Hall, Michael Rosbash e Michael Young, por suas descobertas sobre os mecanismos moleculares que controlam os chamados ritmos circadianos – uma espécie de relógio biológico interno que regula o metabolismo dos seres vivos. As descobertas feitas pelo trio explicam como as plantas, animais e humanos adaptam seus ritmos biológicos de maneira a sincronizá-los com a rotação da Terra.

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Os vencedores do Prêmio Nobel de Fisiologia ou Medicina de 2018 são os americanos Jeffrey Hall, Michael Rosbash e Michael Young, por suas descobertas sobre os mecanismos moleculares que controlam os ritmos circadianos – uma espécie de relógio biológico interno que os seres vivos possuem

O anúncio foi feito nesta segunda-feira, 2, pela organização que concede o prêmio, o Instituto Karolinska, na Suécia. Os três laureados nasceram e trabalham nos Estados Unidos. Hall nasceu em Nova York em 1945 e é professor da Universidade do Maine. Rosbash nasceu em Kansas City em 1944 e é professor da Universidade Brandeis, em Massachusetts. Young nasceu em 1949, em Miami, e atua na Universidade Rockefeller, em Nova York.

O Instituto Karolinska anunciou em setembro um reajuste de 12% no valor dos prêmios Nobel, que permanecia o mesmo desde 2012: 8 milhões de coroas suecas, o equivalente a cerca de US$ 981 mil, ou R$ 3,1 milhões. Os vencedores de 2017 receberão 9 milhões de coroas, o que significa US$ 1,1 milhão, ou cerca de R$ 3,5 milhões. Cada um dos vencedores do Prêmio Nobel de Fisiologia ou Medicina receberá um terço do prêmio.

A premiação foi divulgada em Estocolmo por volta das 11h30 (6h30 na hora de Brasília). Rosbash recebeu a notícia sobre o prêmio às 5 horas da manhã, no horário de Massachussetts, onde reside, de acordo com a agência de notícias sueca TT. “Ainda estou chocado. Estou aqui sentado de pijamas com a minha mulher. Eu não tinha nem pensado sobre isso. Não falei com meus colegas ainda. Não tive tempo nem de tomar uma xícara de café”, afirmou Rosbash, provavelmente com seu relógio biológico ainda afetado pelo telefonema matutino.

Ritmos da vida. O relógio biológico está envolvido com diversos aspectos da complexa fisiologia dos seres vivos. Todos os organismos multicelulares, incluindo os humanos, utilizam esse tipo de mecanismo para controlar os ritmos circadianos. Uma grande proporção dos genes humanos é regulada pelo relógio biológico e, consequentemente, um ritmo circadiano cuidadosamente calibrado adapta nossa fisiologia a diferentes fases do dia.

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O americano Michael Rosbash, professor da Universidade Brandeis, em sua casa em Newton, Massachusetts, logo após receber a notícia de que é um dos três vencedores do Prêmio Nobel de Fisiologia ou Medicina de 2017

“Desde as descobertas seminais dos três laureados, a biologia circadiana se desenvolveu em um vasto e altamente dinâmico campo de pesquisas, com complicações para nossa saúde e bem estar”, disse o comitê do Nobel. Com precisão impressionante, o relógio interno adapta a fisiologia das pessoas às fases radicalmente diferentes do dia. O relógio regula funções fundamentais como o comportamento, os níveis de hormônios, o sono, a temperatura corporal e o metabolismo.

Utilizando moscas de fruta como organismo modelo, os ganhadores do Nobel isolaram um gene único que controla o ritmo diário normal do organismo. De acordo com o comitê do Nobel, eles mostraram que esse gene codifica uma proteína que se acumula nas células durante a noite e depois é degradada durante o dia.

Mais tarde, eles identificaram mais componentes de proteínas envolvidos com esse circuito, expondo o mecanismo que regula o relógio auto-sustentável que existe no interior de cada célula. Com isso foi possível reconhecer que os relógios biológicos funcionam pelos mesmos princípios nas células de todos os organismos multicelulares, incluindo os humanos.

O bem estar humano é afetado quando há um descompasso temporário entre o ambiente externo e esse relógio biológico interno. Um bom exemplo é o “jet lag”, o mal estar causado por uma viagem, quando uma pessoa cruza de avião vários fusos horários. Há também indicações de que um desalinhamento entre o estilo de vida e o ritmo ditado pelo relógio interno está associado ao aumento de risco para várias doenças.

Tempo biológico e tempo social. A premiação para a área de cronobiologia – a disciplina que estuda os ciclos temporais dos organismos – foi uma surpresa para os cientistas envolvidos com esses estudos.

“Para mim foi uma surpresa completa. Nem me passou pela cabeça que o prêmio viesse pela nossa área. Conheço os ganhadores do prêmio, porque nos encontramos em vários congressos científicos. eles são brilhantes, mas não era esperado”, disse ao Estado o especialista em genética e cronobiologia, Mário Pedrazzoli, professor da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (USP).

Segundo Pedrazzoli, porém, o prêmio foi merecido, porque o trabalho dos laureados permitiu compreender como funciona de fato o relógio biológico.

“Esse mecanismo de fato produz uma adaptação ao tempo da natureza, independentemente do nosso tempo social. O tempo social – o tempo no qual vivemos, regido pelos relógios – não coincide com o tempo da natureza, regido pelo dia e pela noite. O descompasso entre o tempo biológico e o tempo social está associado a diversos problemas de saúde, que vão de doenças psiquiátricas até câncer”, declarou Pedrazzoli.

As descobertas de Hall, Rosbash e Young abrem novas possibilidades para a medicina preventiva, de acordo com Pedrazzoli. “Eu mesmo tenho estudos que mostram como diferenças nos alelos de um desses genes que eles descreveram estão associadas à chamada síndrome da fase atrasada do sono – quando as pessoas só conseguem dormir no fim da noite”, disse.

De acordo com Pedrazzoli, as descobertas do trio americano foram apenas o começo de uma nova fase da cronobiologia, que está dando frutos rapidamente. “Precisamos estudar qual é o potencial desse conhecimento para a saúde humana e para a organização social humana. Vamos descobrir como as variações nesses genes nas diversas populações humanas estão associadas a padrões de sono e vigília”, disse.

O professor explica também que esse campo de estudos abre caminho para uma grande discussão sobre o uso do tempo na sociedade. “O tempo social é fixo e não é pensado em termos de como funciona a estrutura temporal do corpo humano. A partir dessa perspectiva, precisamos discutir os impactos do trabalho noturno sobre a saúde, por exemplo, ou como o organismo das crianças é afetado quando as aulas que começam muito cedo”, afirmou.

Genes do tempo. A primeira pista da existência dos ciclos circadianos surgiu no século 18, quando o astrônomo francês Jean-Jacques d’Ortous de Mairan observou plantas do gênero Mimosa – a “planta dormideira”, como é conhecida em algumas partes do Brasil -, cujas folhas se fecham no crepúsculo e se abrem ao amanhecer.

De Mairan descobriu que, mesmo se fosse colocada por vários dias no escuro, a planta continuava seu ciclo diário, murchando à noite e “acordando” pela manhã. Tudo indicava que essas plantas tinham um relógio interno. O fenômeno foi batizado de ritmo circadiano – expressão composta pelas palavras “cerca” e “dia” em latim, para remeter à duração do ciclo, de cerca de um dia. O problema é que ninguém sabia o que controla esse ciclo.

Na década de 1970, o americano Seymour Benzer (1921-2007) e seu aluno Ronald Konopka demonstraram que uma mutação genética desconhecida perturba o ritmo circadiano das moscas drosófilas. Ele batizou esse gene de período – mas ainda não se sabia como esse gene determinava os ciclos circadianos.

O mérito dos três vencedores do Nobel de Medicina de 2017 é que eles conseguiram identificar e isolar o gene período, em 1984. Na época, Hall e Rosbash atuavam juntos na Universidade Brandeis e colaboravam com Young, que pesquisava na Universidade Rockefeller.

Hall e Rosbash conseguiram então descobrir que a proteína PER, codificada pelo gene período, era acumulada durante a noite e degradada durante o dia. Assim, os níveis de proteína PER oscilavam em um ciclo de 24 horas, em sincronia com o ritmo circadiano.

Ainda faltava entender como essas oscilações diárias eram geradas e mantidas. Hall e Rosbash levantaram a hipótese de que a proteína PER bloqueava a atividade do próprio gene período. Eles perceberam que a proteína PER era capaz de impedir sua própria síntese e, assim, regular seus próprios níveis em um ritmo contínuo e cíclico.

Algumas peças do quebra-cabeças ainda estavam faltando, no entanto. Para bloquear a atividade do gene período, a proteína PER, que é produzida no citoplasma das células, precisaria chegar ao núcleo celular, onde fica o material genético. Hall e Rosbash tinham mostrado que a proteína PER aumenta no núcleo das células durante a noite, mas como ela havia chegado lá?

Em 1994, Young solucionou o mistério. Ele descobriu um segundo gene ligado ao relógio biológico, batizado de “timeless” (sem tempo), que codifica a proteína TIM, necessária para um ritmo circadiano normal. Em seu trabalho, Young mostrou que quando a proteína TIM se liga à proteína PER, ambas conseguem entrar no núcleo celular, onde bloqueiam a atividade do gene período, inibindo a produção de mais PER.

Esse mecanismo explicou como a oscilação dos níveis de proteínas nas células acontece. Faltava ainda descobrir o que controla a frequência das oscilações. Young identificou um terceiro gene, batizado de “doubletime” (tempo duplo), que codifica a proteína DBT, responsável por atrasar a acumulação de proteína PER. Isso permitiu explicar como as oscilações se ajustam ao ciclo de 24 horas.

As descobertas feitas pelo trio estabeleceram os princípios-chave para o funcionamento do relógio biológico. Nos anos seguintes, outros componentes moleculares do mecanismo foram elucidados, explicando detalhadamente sua estabilidade e função.

Outros prêmios. Em 2016, o Prêmio Nobel de Fisiologia ou Medicina foi concedido ao japonês Yoshinori Ohsumi, por suas descobertas sobre os mecanismos de autofagia, que é um dos processos de degradação e reciclagem dos componentes danificados das células.

Em 2015, o irlandês William C. Campbell, o japonês Satoshi Omura e a chinesa Youyou Tu, premiados na área de Medicina ou Fisiologia em 2015 por suas descobertas relacionadas a infecções causadas por parasitas e por seus novos tratamentos contra doenças parasitárias.

Entre 1901 e 2017, foram realizadas 108 edições do Prêmio Nobel de Fisiologia ou Medicina. No total, 39 foram concedidos a um só laureado e 12 foram concedidos a mulheres. O mais jovem laureado em Medicina foi Frederick Banting, que recebeu o prêmio em 1923 pela descoberta da insulina. O mais idoso vencedor foi Peyton Rous, que recebeu o prêmio aos 87 anos, em 1966, por sua descoberta dos vírus que induzem a tumores.

O prêmio de Fisiologia ou Medicina é o primeiro da temporada do Nobel 2017. Nesta terça-feira, 3, será anunciado o vencedor do prêmio de Física e, na quarta-feira, 4, o de Química. O prêmio Nobel da Paz será anunciado na sexta-feira, 6 e o das Ciências Econômicas na segunda-feira, 9. A data para o Prêmio Nobel da Literatura ainda não foi divulgada.

http://ciencia.estadao.com.br/noticias/geral,nobel-da-medicina-vai-para-descobertas-sobre-relogio-biologico-interno,70002023720

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