Mauro Iasi – São dois os traços marcantes da conjuntura na qual nos encontramos: há uma quebra de continuidade entre as classes e os segmentos de classe e suas representações políticas e institucionais; ao mesmo tempo, a crise econômica exige um novo patamar de exploração das classes trabalhadoras e isso se expressa na necessidade de novas formas políticas.
“Os representantes e os representados,
enfrentam-se com hostilidade e
não mais se compreendem”
Karl Marx, O 18 de brumário de Luís Bonaparte.
Tais aspectos incidem não apenas nos segmentos dominantes, que disputam o butim resultante do afastamento da presidente eleita, mas, também, sobre a classe trabalhadora. Aquilo que até então foi a forma política da sociabilidade burguesa torna-se estreita para as contradições que habitam seu conteúdo. De forma geral, esse quadro se expressa na superação da “democracia de cooptação” em direção a uma nova forma institucional e política ainda não definida plenamente, que alguns como Felipe Demier denominam de “democracia blindada” (ver: Depois do golpe: a dialética da democracia blindada no Brasil, Maude, 2017) e outros preferem chamar de “estado de exceção”, seguindo Giorgio Agamben (Estado de exceção, Boitempo, 2016).
A base material da crise política encontra-se na crise econômica, mas as mediações entre as duas crises não são fáceis de serem estabelecidas. Os segmentos e frações de classe da ordem se desentendem sobre a saída imediata e os caminhos a seguir, ainda que estejam de acordo com o essencial que se manifesta nas reformas contra a classe trabalhadora. Nesses momentos, pode ocorrer uma dissonância entre os representantes no parlamento e no governo, e as classes que eles efetivamente representam.
Quando Marx tratou do tema em seu clássico O 18 de brumário de Luís Bonaparte, ele destacou claramente que a unidade viabilizada sob a república parlamentarista, isto é, a forma política que tornava possível que as facções da burguesia francesa vivessem lado a lado em “igualdade de direitos”, era, da mesma maneira, “a única forma de Estado em que o interesse geral da sua classe podia submeter a si, ao mesmo tempo, as demandas das suas facções em particular e todas as demais classes da sociedade.” (p.114). A crise exige uma mudança de forma e coloca o Parlamento contra a Constituição.
Não cabe aqui o intricado jogo que se estabelece entre as classes e suas representações, tão brilhantemente descrito por Marx. Mas nos interessa uma descrição precisa que resulta da indecisão do partido da ordem em rasgar a constituição ou apoiar o presidente:
“Com a sua decisão sobre a revisão, o Partido da Ordem demonstrou que não era apto nem para dominar nem para servir, nem para viver nem para morrer, nem para suportar a república nem para derrubá-la, nem para manter a Constituição nem para jogá-la no lixo, nem para cooperar com o presidente nem para romper com ele. De quem ele esperava a resolução de todas as contradições? Do calendário, do curso dos acontecimentos.” (O 18 de Brumário de Luís Bonaparte, p. 120).
As indecisões entre os representantes políticos não expressam nada menos do que as próprias contradições que emanam da crise, que por sua vez exigem mudanças ao mesmo tempo em que precisam que nada mude. No caso particular da conjuntura na qual nos encontramos, o partido da ordem tenta aprovar as reformas que interessam ao capital e torce para que elas produzam efeito sem que seja necessário alterar a forma política no interior da qual os representantes operam e têm protagonismo. Quem operou o golpe que culminou no afastamento da presidente não pode entregar a estabilidade que prometeu. Alguns setores veem no afastamento de Temer a solução, mas outros apostam na sua permanência como condição de estabilidade. Enquanto isso, as frações parlamentares da burguesia conspiram umas contra as outras.
O bloco dominante se divide em frações e estas por sua vez se subdividem dentro e fora do parlamento, em nosso caso agravado por um choque entre as instâncias do próprio Estado (executivo, legislativo e judiciário). O capital financeiro, apertando o torniquete dos gastos públicos, pede o sangramento do fundo público; os monopólios exigem a manutenção das desonerações, subsídios, perdão às dívidas. Manter os juros e ao mesmo tempo baixá-los, comprometer-se em não aumentar impostos e aumentá-los, abrir mercados e tomar medidas protecionistas, resolver a crise de insolvência dos Estados e municípios, salvando os aliados, apurar a corrupção doa a quem doer e comprar os parlamentares para salvar a pele do chefe da quadrilha. Nesse cenário, é como constatava Marx, também no 18 de brumário: “Os porta-vozes e os escribas da burguesia, os seus palanques e a sua imprensa, em suma, os ideólogos da burguesia e a própria burguesia, os representantes e os representados, estranhavam-se e não se entendiam mais.” (p. 120).
Caso nos detivéssemos nesse aspecto, a conjuntura seria marcada por uma grande oportunidade para as classes trabalhadoras. No entanto, vivemos algo semelhante no campo das classes trabalhadoras. A democracia de cooptação se fundamentava num pacto de classes no qual a classe trabalhadora foi sequestrada pela representação que falava em seu nome, mas não representava seus interesses. A crise da democracia de cooptação resultou em uma crise de representação que permite que segmentos da classe trabalhadora sejam capturados pela ideologia dominante ou se pulverizem numa nova serialidade.
De certa forma, a expressão política da democracia de cooptação – a pequena burguesia política – também espera a solução de todas estas contradições “do calendário e da marcha dos acontecimentos”. O calendário marca o ano de 2018 e a marcha dos acontecimentos indica para as eleições presidenciais.
O calendário e as eleições de 2018
Do lado da ordem, a burguesia e suas frações esperam que as reformas e ajustes possam dar sustentação à retomada econômica e os partidos da ordem se coloquem em acordo sobre uma candidatura viável. Essa viabilidade enfrenta um problema principal: a candidatura de Lula, que aparece à frente em todas as pesquisas. Exatamente por isso a ordem espera inviabilizá-la juridicamente, mesmo que a custo de um contorcionismo processual como a sentença do paladino de Curitiba.
Do lado das antigas forças governistas, toda a esperança se joga na retomada da presidência pela eleição de Lula. E aqui está o problema para a esquerda. Ao que parece, o preço para essa retomada seria a reedição do pacto, fato indicado claramente por declarações do próprio Lula, como na entrevista ao Jornal Valor Econômico na qual o ex-presidente afirma que pode manter as reformas aprovadas no governo Temer em nome da estabilidade. Também no próprio Encontro Nacional do PT o ex-presidente depois de dizer que voltará a governar o Brasil pede que se eleja uma maioria parlamentar, porque caso contrário serão necessárias alianças.
É aqui que a ideologia opera de forma decisiva. A ideologia, entre outras coisas, é uma mediação entre os sujeitos e o real. Uma espécie de filtro de significantes que solda uma série para dar sentido à existência. Como no filme Matrix (1999) no qual os seres humanos estão presos às máquinas como pilhas para serem sugados, mas interagem com um programa que mantém a aparência de normalidade. Ninguém acordaria de manhã e se esforçaria para chegar na hora para ser explorado, ter sua força de trabalho expropriada em nome da extração de mais-valor. Fazemos isso para “trabalhar”, um meio honesto de “ganhar a vida” e um caminho legítimo de “ascensão social”.
Aqui a ideologia funciona como uma racionalização. O turbilhão dos acontecimentos gera uma insegurança e uma solução aparece como um bote em uma tempestade… O povo elegerá o novo presidente. Uma suposta jornalista de uma rádio “que só toca notícia” dizia que apesar da crise o lado bom é que as instituições estão funcionando, a Constituição está sendo respeitada e a democracia não foi quebrada, diferentemente do que ocorreu em 1964. Em síntese, a tempestade nos acossa violentamente, mas estamos a salvo em um bote chamado democracia pilotado pelo pirata que afundou o navio no qual estávamos e que chamava… Democracia. Seria bom olhar o que está fora do foco que a ideologia escolhe como centro.
A burguesia não acredita na eleição como “soberania popular”, tanto que se cerca de toda uma série de condições para que não se estabeleça uma verdadeira soberania popular. Desde o financiamento privado de campanha, a estrutura partidária, a legislação eleitoral até os casuísmos como a reforma partidária e a farsa judiciária que pode levar à prisão de Lula.
No caso de Lula as coisas são um pouco mais complexas. Poderíamos concordar que Lula reúne as condições de ganhar as eleições de 2018 e retomar a presidência e isso seria uma derrota para os segmentos conservadores que hoje defendem o governo Temer. Essa possibilidade precisa passar por um difícil teste, pois as eleições se darão em um cenário muito distinto caso comparemos com os últimos pleitos, tanto no que diz respeito ao fato de o PT ter perdido a posição de governo, da histeria antipetista forjada na sociedade, das dificuldades de financiamento e das alianças necessárias. No entanto, digamos apenas como hipótese para continuar o raciocínio, que há uma densidade eleitoral que pode contrabalancear esses aspectos contrários.
Derrotar as forças golpistas é o único que importa neste momento? Ganhar para que e com que programa? Com base em que alianças e com que compromissos? Estas questões ficam relativizadas e são tratadas como um despropósito diante de uma evidência: Lula é o único que pode eleitoralmente fazer frente aos golpistas. Creio que o problema está exatamente nesta “evidência”.
Estamos diante de um comportamento renitente. Recordemos. Lula e sua tendência perderam a disputa no 8º Encontro Nacional do PT (1993) para a esquerda. Se dizia, à época, que Lula era evidentemente o candidato à presidência, mas que a esquerda poderia influenciar seus rumos tendo a maioria no partido. Não foi o que ocorreu. O grupo minoritário no Encontro criou instâncias fora do partido e dirigiu o sentido mais geral da campanha e do programa para depois retomar diretamente a direção partidária sem desmontar as instâncias paralelas construídas em torno do então chamado “Instituto da Cidadania”, hoje significativamente rebatizado de “Instituto Lula”.
Poderíamos dar vários exemplos deste comportamento no qual a vontade coletiva do partido cedeu à direção carismática do seu líder. Preferimos, no entanto, recuar um pouco na história para a gênese desse processo.
As greves e a formação de Lula e do PT
Nas greves metalúrgicas de 1978 e 1979 no ABC paulista, pendia sob os operários a constante ameaça de intervenção no sindicato – o que de fato ocorre na greve de 1979 e depois em 1980. Na preparação da greve de 1978, teve papel decisivo a organização de base na Scania e isso se generalizou na preparação da greve de 1979 através de uma intensa agenda de reuniões por fábrica (Rainho e Bargas. Lutas Operárias e Sindicais dos metalúrgicos de São Bernardo. V. 1. FG, 1983, p. 117). O risco de intervenção era considerado, assim como a experiência da greve de 1978 e a dificuldade de seguir a paralisação por mais tempo, levando a duas iniciativas fundamentais: a constituição de uma “comissão de salários” e de um Fundo de Greve.
O que importa aqui é que tanto uma como outra iniciativa davam um caráter coletivo e enraizavam a ação sindical no conjunto da categoria, enfrentando uma excessiva centralização. No entanto, não havia perda de controle do sindicato, como mostra a reivindicação pelo “delegado sindical” e não pela comissão de fábrica que se apresentava mais autônoma. O verdadeiro controle da massa operária que se levantava era, sem dúvida, a liderança de Lula como prova a intervenção de 22 de março de 1979 quando Lula é afastado da direção de direito, mas segue sendo a direção de fato. O mesmo ocorreria na greve geral metalúrgica de 1980, que além da intervenção levou a maioria da diretoria do sindicato e outras pessoas a serem presas pelo DOPS e enquadradas na Lei de Segurança Nacional, entre eles Lula, que ficou preso de 19 de abril a 20 de maio de 1980.
Ocorre algo aqui muito interessante. O processo que se desenvolve desde 1978 coloca a classe em movimento através de uma instância de organização – o sindicato –, que mede forças contra a ditadura e a enfrenta através da greve. A ditadura ataca com a intervenção naquilo que supunha ser o centro que a mantinha em postura desafiante – o sindicato –, mas a luta segue. A classe tem uma força em si mesma e em seu processo de luta, inclusive criando formas novas que atuam além dos limites sindicais, como o Fundo de Greve, que não apenas recolhia os alimentos para ultrapassar a difícil marca dos 30 dias com o corte dos salários, mas ia até os bairros, os locais de moradia, amealhando solidariedade de amplos setores da cidade e da sociedade.
Neste ponto, a consciência encontra a ideologia. A consciência de classe que ali germinava nos esboços de uma consciência em si não podia ver a si mesma como fonte de sua força, ainda se projeta para algo fora dela, primeiro em uma instituição e depois em um líder. A resultante desta objetivação externada da consciência é seu estranhamento, de maneira que a força da classe aparece como a força do líder. O que se pedia nas assembleias realizadas fora do sindicato, que chegavam a reunir de seis a oito mil operários, tanto em 1979 como em 1980, era a volta de Lula.
Em 1979, quando se estabeleceu a famosa trégua de 45 dias durante a qual se negociaria a pauta dos metalúrgicos acrescida da retomada do sindicato, varias empresas romperam o acordo demitindo trabalhadores (foram demitidos 350 operários), descontando os dias parados ou empregando uma série de outras medidas de pressão (como na Volks, onde se suspendeu os ônibus das 2:20 da madrugada para forçar os trabalhadores a fazerem hora extra até as 5:30). Em várias fábricas estas ameaças foram enfrentadas pelos operários que cruzavam os braços e paravam a produção até reverter a chantagem patronal.
Não devemos desconsiderar o impasse em uma greve, as dificuldades em continuar uma paralisação e a necessidade política de retomar o sindicato, mas prestemos atenção à estrutura do raciocínio que justifica a votação do fim da greve, nas palavras do Lula em 1979: “gostaria de pedir ao trabalhador, se quiser me dar um voto de confiança e à diretoria do sindicato: é que aprovassem esse acordo, que é péssimo. Mas precisamos brigar pela volta da diretoria do sindicato” (Rainho e Bargas, op. cit. p. 238).
A força que segurou a luta e a retomou em 1980 para mudar a correlação de forças do processo de abertura que se seguiria foi a da classe trabalhadora. Não se nega aqui o papel de suas lideranças e das instituições em que se organizava a resistência e a luta sindical, inclusive a liderança carismática de seu maior líder, que foi Lula. No entanto, as lideranças expressam, em sua ação, a força de classe, e não a sua própria. O que aconteceria se uma liderança passasse a acreditar que essa força é dele e não da classe expressa nele? Bom, a primeira consequência é que a classe se torna um meio para realizar o interesse do líder e não este um meio para realizar o interesse da classe.
A história é um arsenal de exemplos. Stálin derrotou os nazistas. Não, quem derrotou os nazistas foi o povo russo, soldados destemidos, generais extremamente capazes e seu comando no Estado Soviético. Lênin não fez a Revolução Russa, nem Trotsky. Por mais que admiremos essas duas lideranças e sua capacidade política, a força capaz de destruir o tsarismo e dar os primeiros passos na direção de uma transição socialista foi a da classe operária russa em aliança com os camponeses. A vanguarda bolchevique, as instâncias soviéticas e depois o Estado Soviético são expressões dessa força constituinte de toda mudança revolucionária. Quando uma classe, no processo de sua constituição enquanto tal, se objetiva em instituições, se externa em organizações e pessoas, ela corre sempre o risco de se alienar nessas objetivações, que dela se distanciam e podem voltar-se contra ela, como uma força hostil que a controla.
De volta à conjuntura atual: como ficamos?
Voltemos à conjuntura. Temos três intencionalidades que disputam o sentido da “marcha dos acontecimentos”. O bloco da burguesia e seus aliados; a pequena burguesia política desalojada do governo; os trabalhadores.
O bloco burguês, como dissemos, se unifica na necessidade das reformas contra os trabalhadores, mas se divide sobre quem deve governar e sobre a dimensão da reforma política necessária. A linha da discórdia parece ser se a profundidade da reforma política deve ou não eliminar as atuais mediações, isto é, os grandes partidos da ordem burguesa (PMDB, PSDB, DEM, PT etc.) e buscar novas formas.
A pequena burguesia quer voltar ao governo, e para isso opera essencialmente em duas frentes: reunificar sua base social, o que lhe permitiria manter a força eleitoral, e reconstruir sua base de alianças, o que lhe garantiu no passado a governabilidade sob o reinado da democracia de cooptação. Aí está sua contradição, pois para garantir a primeira tarefa, precisa se apresentar contra as reformas, e para lograr a segunda, precisa apresentar o compromisso de mantê-las. O PT já fez isso antes, com Lula em 2002 e Dilma em 2014, mas ao que parece o espaço para isso está diminuindo. A solução está na liderança carismática. As massas não precisam concordar com o que ele faz, mas acreditar nele e na premissa de que será “em seu nome”. É um convite, vejam, para votar em um “acordo péssimo”, mas precisamos voltar ao governo. A força de toda armadilha ideológica é fazer crer que um determinado interesse particular é universal.
O destino da classe trabalhadora derrotada e serializada é se fazer representar por uma destas duas alternativas: ou respaldar a ordem burguesa, em parte pela manipulação do combate à corrupção ou ao “perigo do petismo”; ou manter sua representação alienada na política de conciliação de classes da pequena burguesia. A única forma dos trabalhadores superarem o estágio que Marx apontava no seu 18 de brumário – isto é, “eles não são capazes de representar a si mesmos, necessitando, portanto, ser representados.” (p. 143) – é entrar em cena com força própria.
É precisamente nesse ponto que a questão do programa se mostra essencial, pois permite ir além das aparências e trazer à tona os interesses de classe: a burguesia quer e precisa das reformas, além disso, aponta para a necessidade de aprimorar o Estado Burguês superando a atual forma “democrática”; a pequena burguesia quer voltar ao governo, as reformas são secundárias e a forma política do Estado Burguês é o limite de sua ousadia, quer recuperar sua forma democrática; os trabalhadores são contra as reformas e precisam combatê-las, sua vontade política não pode se expressar na atual forma do Estado Burguês.
O dilema da esquerda é que ela expressa a serialidade da classe derrotada e não a possibilidade de sua nova fusão. Ela tem a obrigação de apresentar programaticamente os interesses de classe dos trabalhadores, com independência e autonomia em relação à burguesia e à pequena burguesia política, mas sua eficácia depende do movimento real da classe. Caso mantenha-se capturada pela hegemonia da conciliação de classes, a esquerda tende a se isolar. Alguns festejam isso de forma bizarra enquanto cavam um pouco mais fundo a cova em que se enterram.
A solução da pequena burguesia implica no sacrifício dos interesses dos trabalhadores, mas pode ser o caminho para a solução dos problemas do bloco burguês. Este só pode se impor, por si mesmo, pela derrota das pretensões da pequena burguesia e dos trabalhadores, mas tem força para isso, pois tem o Estado Burguês ao seu dispor. O bloco pequeno burguês não pode se impor por si mesmo, sem a aliança de classes com o bloco dominante e sem o apoio passivo do bloco popular.
Afinal, não tem força própria e autônoma, pois abdicou de uma governabilidade popular. Os trabalhadores, enquanto sequestrados pela hegemonia da pequena burguesia política, tampouco expressam força própria. Dependem apenas de suas próprias forças, é verdade, mas acreditam ainda que dependem de tudo, menos de si mesmos. Só poderiam se apresentar como força própria em um terreno de luta diverso do cenário eleitoral, pois exige uma fusão de classe que superasse sua serialidade atual, indo além das antigas formas e gestando outras abertas ao futuro e não como ecos pálidos do passado. Isso só se gesta na luta, inevitavelmente no interior de ordem instituída, mas além dos limites instituídos como vimos em 1979 e 1980.
Para os primeiros tratava-se de primeiro derrotar a Dilma, e depois… Já para os segundos, trata-se de primeiro derrotar o Temer, depois… Para os trabalhadores o depois é a destruição dos limitados direitos trabalhistas, a reforma da previdência e o saque do fundo público. O depois é Rafael Braga e todos nossos irmãos apodrecendo na prisão enquanto advogados e juízes competentes libertam um por um a canalha governante.
Por isso a burguesia e a pequena burguesia política esperam a salvação orando ao calendário e a marcha dos acontecimentos, enquanto os trabalhadores querem rasgá-lo criando novos fatos que sejam capazes de libertar o tempo.
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