Política

Dez anos de impunidade e espoliação

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Guilherme Boulos – Há exatos dez anos, em 12 de janeiro de 2007, as obras da estação Pinheiros do Metrô de São Paulo cederam, abrindo uma enorme cratera. Sete pessoas morreram, várias ficaram feridas, casas foram destruídas.

A investigação do Instituto de Criminalística concluiu que a tragédia foi causada por problemas de execução na obra, conduzida pelo Consórcio Via Amarela, composto pela Odebrecht, Camargo Corrêa, Queiroz Galvão, OAS e Andrade Gutierrez. Apesar disso, a Justiça paulista absolveu os representantes do Metrô e das construtoras, após nove anos, em novembro passado.

Os 14 réus foram inocentados embora tenham sido levantados indícios de pagamento de propina a promotores para favorecer as construtoras na investigação. Tanto a operação Castelo de Areia, em 2009, quanto a Lava Jato encontraram indícios de repasses milionários rateados entre as construtoras para promotores do caso, identificados por codinomes, conforme o notório costume da Odebrecht. Mesmo com a denúncia vindo à tona no fim do ano passado, a absolvição foi mantida.

O caso da linha 4-amarela do Metrô reforça uma tradição e derruba um mito.

Mais uma vez foi posta à prova a tradição de impunidade na Justiça de São Paulo em relação a quaisquer investigações que envolvam o governo do Estado, em mãos tucanas há mais de 20 anos. Foi assim no cartel dos trens, no escândalo do Rodoanel e na máfia da merenda, para ficar apenas com os mais recentes.

A linha 4-amarela não ficou conhecida somente pela cratera, mas também como a primeira experiência de privatização do metrô paulista. Além de executar parte das obras, três empreiteiras do Consórcio Via Amarela (Odebrecht, Camargo Corrêa e Andrade Gutierrez) receberam ainda concessão para operar a linha por 30 anos, como acionistas do Consórcio Via Quatro. Os incríveis atrasos e aditivos na conclusão da obra servem para derrubar o mito da eficiência da gestão privada.

A construção da linha 4-amarela foi iniciada em 2004 com a previsão de entrega de suas 11 estações em 2012. Nesta data apenas seis estações haviam sido entregues. O prazo foi estendido então para 2014. Hoje, 13 anos após o início das obras, apenas sete estações estão em funcionamento. A nova previsão é de conclusão em 2018. Neste ínterim, o Via Amarela recebeu sucessivos aditivos por “custos indiretos” e “reequilíbrio econômico-financeiro”, que ultrapassaram R$ 130 milhões.

Mas isso não é nada perto da recente jogada do Via Quatro, gestor da linha. O consórcio está cobrando a bagatela de R$ 428 milhões do erário público como ressarcimento pela perda de receitas decorrente do atraso na conclusão da primeira fase da linha. Ora, esta fase foi executada pelo Via Amarela, que tem três construtoras que também participam do Via Quatro. Ou seja, as empreiteiras poderão receber ressarcimento público pelos atrasos que elas próprias causaram.

Longe de ser fato isolado, esta jogada revela a lógica das empresas privadas na gestão de serviços públicos: privatizar os lucros e socializar os prejuízos. Alguns chamam isso de concessão. Melhor seria chamar de espoliação.

Não obstante o fracasso do modelo da linha 4, o governo Alckmin anunciou que, neste décimo aniversário da tragédia de Pinheiros, pretende repassar outras duas linhas para a iniciativa privada. O legado de acidentes, atrasos e extorsão deixado pela linha 4 deveria ser suficiente para enterrar este modelo. Ampliá-lo representa uma afronta ao interesse público.

http://www1.folha.uol.com.br/colunas/guilhermeboulos/2017/01/1849118-dez-anos-de-impunidade-e-espoliacao.shtml

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