Henrique Evers, Guilherme Iablonovski e Fernando Corrêa – É bem conhecido o padrão de urbanização no Brasil ao longo do século 20, quando o país passou de uma nação majoritariamente rural para uma das mais urbanizadas do planeta. Sabe-se menos sobre como tem ocorrido a expansão urbana a partir da virada do século, quando mais de 80% da população brasileira passou a viver em cidades.
A expansão dos centros urbanos e a forma que assumem ao longo do tempo influenciam o nível de acesso a oportunidades, o uso de recursos, as emissões de gases de efeito estufa e a conservação dos ecossistemas. Enfrentar os múltiplos desafios urbanos da atualidade, como a desigualdade e a mudança do clima, passa por compreender como tem se dado esse processo, suas causas e consequências.
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Um novo estudo do WRI Brasil lança nova luz sobre essas questões ao revelar os padrões de crescimento das cidades brasileiras entre 1993 e 2020. O texto para discussão Trinta anos de expansão vertical e horizontal em cidades brasileiras analisa se as concentrações urbanas no país se espraiaram ou se adensaram, e se esse aumento construtivo correspondeu a um crescimento populacional. Conheça algumas das conclusões do estudo.
Metrópoles se verticalizaram, cidade médias e pequenas estabilizaram ou se espraiaram
A pesquisa adotou uma metodologia inovadora, que combinou dados de sensores de radar, do MapBiomas e do IBGE. O território das cidades foi segmentadoo em parcelas e, para cada uma dessas áreas, foi identificado o crescimento populacional e o tipo de expansão predominante nas últimas três décadas: forte expansão horizontal, expansão horizontal moderada, estabilidade, expansão vertical moderada ou forte expansão vertical. A proporção entre os vários tipos de crescimento indicou a tendência de expansão em cada cidade.
Foram identificados quatro grupos de cidades, de acordo com as tendências de expansão observada: cidades em espraiamento intenso, cidades em espraiamento moderado, cidades em estabilidade e cidades em contínua verticalização.
Em processo de espraiamento intenso (crescimento rápido e plenamente horizontal) estão concentrações urbanas médias importantes, como Campo Grande, Cuiabá, Natal, Manaus, Palmas e Teresina.
Nos grupos de espraiamento moderado e estabilidade, estão a maioria das concentrações médias e pequenas do país…
…e poucas metrópoles, como São José dos Campos e Florianópolis
O grupo em contínua verticalização é composto por cidades populosas como São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília e Belo Horizonte, e cidades em suas áreas de influência direta.
Expansão construtiva e populacional em descompasso
Um dos resultados mais significativos diz respeito à relação entre expansão construtiva e populacional – ou à ausência dessa relação.
Na maioria das cidades brasileiras, e em quase todas as concentrações médias e grandes, constrói-se em taxas superiores ao aumento da população. O gráfico abaixo mostra que essa relação é verdadeira em grande parte das capitais, como Belo Horizonte, Natal, Porto Alegre, Rio de Janeiro e São Paulo.
O Censo de 2022 trouxe informações que reforçam a hipótese de o aumento do volume construído não responder à demanda por habitação, ao revelar uma tendência de estabilização em grandes cidades – e que sete capitais com mais de 1 milhão de habitantes tiveram redução populacional entre 2010 e 2022. Futuras pesquisas podem investigar quais fatores influenciam esse processo. Por exemplo, se está relacionado à especulação imobiliária ou à adoção de grandes edificações com poucas unidades habitacionais.
Crescimento ao longo dos últimos 30 anos refletiu economia
É possível relacionar as variações nas taxas de expansão com os momentos econômicos do Brasil no período.
Nos anos 1990, há uma variação positiva que se alinha com a recuperação da crise vivida pelo país na década anterior e com a retomada dos investimentos no setor habitacional e na construção civil.
A partir de 1997, há uma tendência de desaceleração em todas as formas de crescimento.
De 2007 a 2013, observa-se uma variação positiva na taxa de crescimento horizontal.
Em 2014, o gráfico apresenta um ponto de inflexão que corresponde ao forte impacto na construção civil brasileira da crise econômica que atingiu o país. A expansão horizontal passa a desacelerar bruscamente, enquanto a expansão vertical inicia uma nova aceleração, como a registrada nos anos 1990.
Outro aspecto interessante é que a taxa de crescimento vertical é superior à de expansão populacional em quase todo o período, o que indica um descompasso entre a tendência de adensamento construtivo e a densidade demográfica. O adensamento das cidades pode ser positivo se representa oferta de habitação próxima às oportunidades urbanas, mas esse não parece ser o caso.
Metodologia pode ser aplicada em novas análises
O planejamento urbano sustentável deve considerar a relação entre expansão horizontal e vertical para garantir cidades com um acesso menos desigual às oportunidades urbanas, especialmente à moradia adequada, e para promover um equilíbrio entre densidade populacional e oferta de infraestrutura. Para incidir nesse sentido, é chave compreender como as cidades estão crescendo, e que fatores contribuem para esse processo.
O estudo Trinta anos de expansão vertical e horizontal em cidades brasileiras representa um primeiro passo importante ao mostrar que a expansão do tecido urbano vem avançando sem relação com os movimentos populacionais, inclusive nas principais metrópoles do país, e ao suscitar novas perguntas: que tipo de construção se está adotando? Qual a relação entre esses tipos de crescimento e as emissões urbanas? Que populações têm ocupado as margens e os centros adensados dessas cidades?
A metodologia adotada e os dados gerados no estudo, disponibilizados para download, abrem caminho para pesquisas futuras que respondam a essas e outras perguntas. Essas associações poderão trazer importantes evidências históricas na definição das causas e mecanismos pelos quais se deu a expansão urbana brasileira recente.
Fonte da matéria: Como cresceram as cidades brasileiras nos últimos 30 anos? | WRI Brasil – https://www.wribrasil.org.br/noticias/crescimento-cidades-brasileiras-verticalizacao-espraiamento-30-anos
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