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Brexit: avanço da “direitização” e do neoliberalismo

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GRUPO DE SÃO PAULO – O referendo ocorrido em 23 de junho de 2016 no Reino Unido (Inglaterra, Escócia, País de Gales e Irlanda do Norte) constatou que os britânicos rejeitam a União Europeia (UE), deram adeus à Europa, à Bruxelas e à comunidade europeia. Há risco de implosão da UE e, ao mesmo tempo, do Reino Unido. Quais serão as consequências deste fato?

Seria muita pretensão de nossa parte elucubrar o que ocorrerá, todavia é possível especular sobre temas e questões de prováveis conflitos de interesse. É muito difícil prever o futuro, porém, é relevante a identificação dos fatos potencialmente explosivos.

É evidente que o mundo passará por tensões provindas de todas as áreas: econômica, política e social. Em situações como a que a Europa vive hoje, razões econômicas muito graves surgirão e serão antecipadas por também graves fatos políticos e sociais a serem vivenciados e resolvidos.

Questões políticas relevantes:

1. O risco da decisão do Reino Unido de abandonar a UE e o tempo para que esta decisão torne-se real.

Pelo que se lê nos principais jornais do mundo, a Inglaterra quer prolongar o processo de saída. Alemanha, França e Itália (em nome da UE) querem apressar a saída. David Cameron, primeiro-ministro inglês, rejeita a pressão. Os três países que desejam uma solução rápida estão a demonstrar que os britânicos não são mais parte da UE. Não se trata mais de discutir com membros (Estados solidários) da União Europeia, mas com outro Estado com quem se disputa o poder. É evidente a repercussão dessa situação na política internacional.

2. As diferenças na votação por região do Reino Unido.

Dois países, Inglaterra e País de Gales, querem sair da UE; dois outros, Escócia e Irlanda do Norte, querem permanecer. A votação de 23 de junho, além de dividir a opinião pública, colocou em evidência diferenças entre países do Reino Unido. Escócia e Irlanda do Norte são contra o rompimento com, respectivamente, 62% e 55,8% em favor de continuarem na União Europeia.

3. A premiê da Escócia, Nicola Sturgeon, já anunciou que pretende pedir ao parlamento do seu país que bloqueie o processo de Brexit

Segundo o Estado de S. Paulo (27/06/16), “a iniciativa faz parte de uma ofensiva de deputados em Edimburgo e em Londres contra o resultado do referendo em que 51,9% dos britânicos decidiram pela ruptura dos laços entre Londres e Bruxelas”. O primeiro-ministro britânico decidiu renunciar, no prazo de até três meses, por discordar da saída da UE. Estes fatos reacendem os riscos de implosão do Reino Unido. Já têm ocorrido manifestações em defesa da independência da Escócia e pela reunificação da Irlanda com a saída da Irlanda do Norte do Reino Unido.

4. A crise das migrações, um dos argumentos mais usados para o divórcio entre Reino Unido e União Europeia, é uma questão que atinge toda a Europa.

Dois exemplos mostram essa evidência. Nas eleições na Áustria “em decisão inédita, a Corte Constitucional do país declarou (…) que seja realizada uma nova votação. Em maio, o representante da extrema-direita no país, Norbert Hofer, foi derrotado (…) e entrou com recurso na Justiça. Ele tentará ser o primeiro chefe de Estado de extrema-direita na Europa desde a 2ª Guerra” (Estado de S.Paulo, 07/07/16, pág. A 11). O segundo exemplo, refere-se à Hungria, país que se notabilizou por posição fortemente xenófoba simbolizada pela construção de um muro de arame farpado separando-a da Sérvia e da Croácia.

Viktor Orban, líder político húngaro, há meses vocifera contra as cotas para migrantes sugeridas pela União Europeia. A polícia de seu governo costuma reprimir com muita violência os migrantes que lá chegam. Agora utiliza uma nova arma: um referendo. Em 2 de outubro, os húngaros deverão responder a seguinte questão: “vocês aceitam que a União Europeia possa decretar uma realocação obrigatória de cidadãos não húngaros na Hungria, sem aprovação do Parlamento húngaro?” É óbvio prever-se um forte ”não” como resultado.

Assiste-se o renascer do nazi-fascismo resultante de vários fatores, inclusive a implementação de políticas neoliberais nos países da UE. Essas políticas foram induzidas principalmente pela Inglaterra que nunca aderiu ao euro, mantendo sua independência quanto a Bruxelas. Lembremo-nos do objetivo da política definido por Margaret Thatcher para o Reino Unido: “todo o grande mercado; nada além do grande mercado”.

A mesma tendência verifica-se nos EUA. A corrida eleitoral coloca o candidato do Partido Republicano com possibilidade de ser eleito. As posições defendidas por Donald Trump são piores que aquelas postas em prática por vários presidentes que levaram os EUA a negar várias conquistas da sociedade norte-americana. Elas são racistas, isolacionistas e xenófobas. Há relação entre a vitória do Brexit e o aumento das chances de Trump ser eleito presidente.

A tendência à “direitização radical” (fascista) vai além da Europa e Estados Unidos. O atual golpismo latino americano – Honduras, Paraguai e Brasil – constituem exemplos recentes desse processo de golpe branco ou parlamentar. Não é por acaso que a diplomata Liliana Ayalde foi embaixadora dos Estados Unidos no Paraguai de 2008 a 2011 e assumiu o posto de embaixadora no Brasil cinco meses antes da Operação Lava Jato começar a esquentar. Muito significativa também é a frase da embaixadora “o controle político da Suprema Corte é crucial para garantir impunidade dos crimes cometidos por políticos hábeis. Ter amigos na Suprema Corte é ouro puro”.

O caso do nosso país é emblemático, as primeiras medidas tomadas pelo governo Temer confirmam seu caráter golpista, entreguista, antipovo. A permanecer a situação atual, o Brasil tenderá a se consolidar como uma republiqueta cleptocrata/ evangélica/fascista. Tudo “legitimado pela justiça”.

Desafortunadamente, o que ocorre na Europa faz parte de um processo global. “É hora de se perguntar com seriedade qual mundo o populismo de direita poderá construir” (Antonio Luiz M. C. Costa – “Admirável mundo velho”; Carta Capital ano 21 nº 909).

Ainda uma última observação. O Espaço Schengen (espaço de livre trânsito dos cidadãos sem controle de fronteiras) cuja construção foi iniciada em 1985, quando cinco Estados membros da União Europeia decidiram suprimir o controle de suas fronteiras internas, está ameaçado. A criação do Espaço Schengen significa um dos maiores feitos da UE. Países antes em guerra agora têm garantida a liberdade de circulação em um território que engloba 26 Estados, totalizando mais de 400 milhões de cidadãos. Essa conquista esta em perigo. Vários países europeus estão a construir muros e barreiras e operam com forças policiais que reprimem o livre trânsito.

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