LUIZ EÇA – As origens do conflito entre a OTAN e a Rússia vêm dos tempos malfadados do presidente George W. Bush.
Naquela época, os EUA acreditavam que o Irã estava desenvolvendo um programa de armas nucleares. E que os supostos fanáticos aiatolás, assim que tivessem a bomba, não hesitariam em lançá-la contra os países europeus, massacrando os “infiéis” que os habitavam.
Foi quando Bush resolveu construir uma rede de mísseis antibalísticos para proteger a Europa de uma futura ameaça nuclear iraniana.
Evidentemente teria de se localizar no leste da Europa para fechar o caminho dos foguetes iranianos. Talvez por coincidência, todos os países da região eram ex-satélites da extinta União Soviética e ainda guardavam ressentimentos dos agravos sofridos da parte da pátria-mãe do socialismo. Razão porque eles tinham se tornado membros da OTAN, a força militar americano-europeia criada para defender o Velho Continente dos apetites moscovitas.
O governo russo protestou vigorosamente, via nesse sistema uma ameaça a ser plantada na porta de entrada do país, bem próximo de suas fronteiras.
Com Bush e depois Obama, os EUA continuaram a instalar seus engenhos, alegando terem objetivo meramente defensivo.
Putin, depois Medvedev e depois novamente Putin nunca aceitaram. Por acaso os EUA ficariam tranquilos caso os russos colocassem mísseis antibalísticos na fronteira do México, apontados para o território norte-americano?
Assim, as relações entre os dois países foram azedando progressivamente.
Recentemente, aconteceram fatos que fizeram as coisas ficarem ainda mais complicadas.
O Irã provou que não tinha qualquer programa de armas nucleares e assinou um acordo que o impede de iniciar algo semelhante pelo menos nos próximos dez anos. Com isso, desaparecia a necessidade de a Europa ser protegida pelos sistemas antibalísticos norte-americanos.
Os EUA poderiam desativar os sistemas já montados e interromper o programa de implantação de novos. Mas não fizeram nada disso. O que fizeram foi participar ativamente da revolução que derrubou o regime pró-Rússia da Ucrânia, ação considerada por George Friedman, presidente do respeitável think-tank, Strafor, como “o mais clamoroso golpe da história”.
Os russos reagiram, estimulando a secessão do leste ucraniano (de maioria russa) e anexando a Criméia, fato referendado em seguida pela população local, também de maioria russa.
Foi o que bastou para os EUA anunciarem que o governo do voraz Putin precisava ser detido. Caso contrário, ele não iria ficar nisso, de olho que estaria na Ucrânia, nos países Bálticos e mesmo na Polônia, Romênia e outros países ex-coadjuvantes do establishment soviético.
Os membros europeus da OTAN foram mobilizados para juntamente com os EUA enviarem tropas para reforçar as fronteiras dos países “do bem” com a Rússia.
Jogos de guerra foram realizados com a participação de grandes contingentes militares. Putin reagiu fazendo exatamente a mesma coisa. Agora, anuncia-se que mais 4 mil soldados da OTAN serão enviados para as fronteiras da Rússia com os países Bálticos, Ucrânia e Mar Negro. Lá deverão ficar permanentemente. É mais lenha na fogueira.
Espera-se de Putin um lance semelhante para breve.
Um número cada vez maior de soldados dos dois lados estão se confrontando numa distância bem próxima. Cada vez maiores são as chances de uma decisão inadvertida provocar um choque, que poderá detonar um conflito guerreiro de proporções mundiais.
Esse clima de pré-guerra vem sendo incentivado nos EUA pelo War Party (Partido da Guerra). É o nome que jornalistas norte-americanos dão aos grupos favoráveis à guerra, não como último recurso, mas talvez o primeiro. Eles são integrados por todos os setores que têm muito a ganhar com conflitos bélicos: generais do Pentágono, indústrias de armamentos (sem guerras, o que seria dos lucros delas?), políticos-pastores e agitadores de direita, parte da mídia e contractors, entre outros.
Talvez a mais fulgurante estrela do War Party no teatro do leste europeu seja o até há pouco comandante das forças da OTAN: o general Philip Breedlove.
Baseado em informações de círculos do governo alemão, o Der Spiegel publicou algumas das sinistras revelações deste bravo cabo de guerra. E os respectivos desmentidos que as acompanharam.
Em março de 2014, ele declarou que a Rússia tinha 40 mil soldados na fronteira com a Ucrânia, prontos para atacar.
Os serviços de inteligência de outras nações da OTAN informaram que o número de soldados russos era muito menor e não havia nada que indicasse intenções agressivas. Em novembro de 2014, o incansável comandante voltou à carga: tropas russas teriam cruzado a fronteira ucraniana. Provou-se que não era verdade.
De acordo com o Der Spiegel, acusações de Breedlove sobre a presença de tanques e sistemas de defesa antiaérea na Ucrânia não foram confirmadas nem pelos satélites dos serviços de inteligência alemães, nem por serviços de inteligência de outros países aliados aos EUA.
Recentemente, mais uma bola fora do agressivo general. Os mesmos serviços de inteligência desmentiram o anúncio feito por Breedlove da presença de tropas de combate russas, batalhões de artilharia e de mais de mil veículos de combate, em território ucraniano.
Ao depor no Congresso dos EUA, ele foi ainda mais longe. Declarou que a Rússia estava se preparando para invadir a Ucrânia com um exército de 80 mil soldados. Não preciso dizer que os desmentidos choveram.
Mas Breedlove não está sozinho nas suas ficções antirrussas. Preocupado com as consequências do alarmismo dele, seu sucessor no comando das forças da OTAN, o general tcheco Per Pavel, quis acalmar as tensões.
Afirmou que não havia absolutamente nenhuma informação dos serviços de inteligência a sugerir alguma possibilidade de a Rússia invadir a região. Foi o bastante para que, dois dias depois, o general Hodge, solidário a Breedlove, pulasse para contradizer Pavel: a Rússia conquistaria toda a área em 36 a 60 horas, se quisesse.
Somou-se a ele, Jens Stollenberg, secretário-geral da OTAN: “nós teremos pouco tempo para decidir quando vamos enfrentar um possível ataque”. Portanto, que venham mais tropas, mais aviões, mais tanques…
E que permaneçam nas fronteiras, de olho nas movimentações das tropas de Putin para o Ocidente não ser pego de calças curtas. Esse espírito guerreiro é visto com preocupação por personalidades de diversos países do Velho Mundo.
O Der Spiegel relatou que Frank-Walter Steinmeier, ministro do Exterior da Alemanha, criticou Breedlove, taxando suas comunicações de “propaganda perigosa”. Posteriormente, em artigo no Sueddeutsche Zeitung, o ministro fez uma advertência contra o que chamou de “bravatas e irritantes gritos de guerra”.
Em entrevista à BBC, declarou que a OTAN deveria, mais à frente, procurar mais diálogo com a Rússia em vez de criar pretextos para instigar a guerra contra o governo de Moscou.
Comentando as grandes manobras militares realizadas há alguns meses pela OTAN, Steinmeier disse que eram contraproducentes para a segurança regional e poderiam inflamar tensões com a Rússia. “O que não devemos fazer é pôr fogo na situação através de bravatas e incitações à guerra” (publicado no Bild am Sontag).
É o que os EUA e alguns líderes linha-dura da OTAN estão fazendo. Pensam que com intimidações irão assustar e conter o rebelde Putin, evitar que ele se lance a novas ações expansionistas. E aceite as decisões da Casa Branca, saindo da Criméia, abandonando os revolucionários do leste da Ucrânia e esquecendo seus supostos projetos de recuperar o poder da extinta União Soviética.
Na verdade, estão provocando a onça com vara curta.
Por enquanto, Putin não vem seguindo o script desejado por seus adversários. Pelo contrário, cada demonstração de força da OTAN gera igual demonstração de força de Moscou. Até onde isso irá parar?
Falando a jornalistas estrangeiros em São Petersburgo, Putin deixou claro que a escalada no leste europeu pode acabar numa guerra nuclear. Ele informou que dentro de poucos anos, o alcance dos sistemas de mísseis norte-americanos instalados perto das fronteiras russas poderia atingir alvos a 1000 km de distância. O que deixaria o território russo sem segurança.
Putin não irá permitir que os EUA cheguem a esse limite. Ficando omisso, o potencial nuclear russo e, portanto, o equilíbrio nuclear entre EUA e Rússia ficaria em perigo. Para o presidente da Rússia, a paz mundial depende desse equilíbrio.
Putin concluiu: “Como vocês não entendem que o mundo está sendo empurrado numa direção irreversível?”
“Se queres a paz, prepara a guerra (se vis pacem, para bellum)”. Seguindo esse princípio, os romanos participaram de dezenas de guerras em todo o mundo de sua época. É um mau exemplo para nações que desejam que o planeta sobreviva.
http://www.correiocidadania.com.br/index.php?option=com_content&view=article&id=11815:terceira-guerra-mundial-pintando-no-horizonte&catid=72:imagens-rolantes
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