Eduardo Ramos – Na França, pela morte “apenas” de um jovem pela polícia, a população, classe média aí incluída, foi às ruas em fúria!
“Não podemos tapar o sol com a peneira e fingir que nada está acontecendo, demorou pra matar esses vagabundos e quem estiver apoiando bandido igual esse negro maldito e ouvidor das polícias tem que morrer também. Essa é a minha posição. Vai virar guerra e eu estou pronto”, diz a mensagem no Whatsapp vista pela reportagem.
O parágrafo acima, demonstração máxima da selvageria e barbárie que uma nação pode chegar, esse patamar de esgoto, de incivilidade absoluta, cita a fala de um policial AMEAÇANDO DE MORTE O OUVIDOR DAS POLÍCIAS DE SÃO PAULO, Claudio Aparecido da Silva. O motivo do ódio homicida? Claudio cumpriu o seu dever e foi ouvir os moradores das comunidades na Baixada Santista, onde, até agora, 16 pessoas morreram em decorrência da “Operação Escudo”, montada nem se sabe mais por quê, já que o motivo verdadeiro, esse sim é conhecido até pelas pedras: vingar, através do maior número de mortes o possível, a morte de um policial da Rota em confronto com bandidos há uns poucos dias.
Como se honrar a memória do colega morto implicasse única e imediatamente, em empilhar cadáveres e mais cadáveres nas ruas dessas comunidades, até chegarem, talvez, a uma espécie de “número satisfatório” para sua sede mórbida e assassina por sangue e vingança.
Algumas das informações colhidas no artigo citado no título são estarrecedoras. Leiam com ATENÇÃO, amigos leitores, absorvam a totalidade da dimensão do HORROR a que são submetidas essas comunidades, predominantemente habitadas por gente humilde, digna e trabalhadora, e que a mídia demoniza, justificando seu contínuo genocídio, porque nelas moram uma minoria de bandidos e traficantes. Abaixo alguns relatos da brutalidade covarde a que são submetidos esses brasileiros:
do ouvidor das Polícias, Claudio Aparecido: “O cenário é devastador. É UM CENÁRIO DE PÂNICO, DESESPERO E RECEIO PELA PRÓPRIA VIDA. Cada pessoa com quem a gente falou disse praticamente as mesmas coisas. Invasões de casas, ocupações de barracos, agressões, invasões de banheiros com mulheres tomando banho”;
do ouvidor, sobre os discursos farsescos do governador Tarcísio de Freitas e seu secretário de segurança pública, Guilherme Derrite, afirmando que “TODAS as mortes ocorreram em confronto entre os bandidos e os policiais”: “os relatos que a gente tem recebido de vizinhos, pessoas que presenciaram cenas, É EXATAMENTE O CONTRÁRIO. Tem denúncia de que vítimas foram arrastadas para determinados lugares para serem executadas”.
Paro por aqui. São dezenas de relatos semelhantes que podemos encontrar nos bons blogs independentes de jornalismo.
Termino com uma notícia que me trouxe um gosto amargo na boca, comum quando um genocídio se personaliza em uma das vítimas, vemos sua fotografia, e o testemunho de quem o conhecia. Falo do ASSASSINATO PERVERSO, COVARDE, INOMINÁVEL do jovem garçom Felipe do Nascimento no Guarujá. Vendia refeições em um quiosque, seu ex-patrão disse que era um dos melhores vendedores, antigo no local, querido pelos clientes, pai de filhos e enteadas adolescentes, JAMAIS ENVOLVIDO COM O CRIME. Adivinhem o que a brava polícia da ROTA que o matou relatou sobre a morte? Confronto! O garçom, que saíra de casa para comprar algo para um dos filhos, morreu baleado.
Para o governador e seu secretário, apenas mais um bandido morto merecidamente pelos PMs.
Na França, pela morte “apenas” de um jovem pela polícia, a população, classe média aí incluída, foi às ruas em fúria! Incendiaram veículos, paralisaram bairros inteiros, criaram um caos, se fizeram ouvir pela força de seus gritos de revolta, indignação e suas ações.
Aqui, uma das famosas frases de nossas elites e classes médias diante de fatos perturbadores de quaisquer ordem é: “país de merda! Um dia saio daqui!” – sonho de consumo de dez em dez desses brasileiros.
Esquecem, é inacreditável mas esquecem, que quem faz um país ter uma face civilizada, justa, democrática, pacífica, não são só os poderosos, governos, etc., é a parcela do povo que tem poder e voz para mudar essa face quando ela é tenebrosa, degradante, perversa, desumana. Esquecem que em qualquer lugar e época, “sociedades de merda fazem uma merda de país”.
A trágica indiferença com que nossa classe média absorve, como “se natural fossem”, chacinas e genocídios contra índios, favelados, e outros segmentos que são como que inexistentes, invisíveis para essa classe social, é uma de nossas chagas mais vexaminosas, uma cultura desumana e cúmplice de todo o horror que vivemos há séculos.
Flávio Nascimento, jovem, alegre, que fazia vídeos engraçados nas redes sociais e alegrava seus clientes enquanto os servia, é mais um morto na conta dessa perversa indiferença.
Fonte da matéria: A cultura da indiferença da classe média, por Eduardo Ramos – https://jornalggn.com.br/opiniao/a-cultura-da-indiferenca-da-classe-media-brasileira-por-eduardo-ramos/
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