Sergio Lamucci – O Brasil perdeu terreno em relação a outros emergentes nas últimas décadas, distanciando-se do nível de renda dos países desenvolvidos, em vez de se aproximar. Com o baixíssimo crescimento da produtividade, o PIB per capita brasileiro corresponde hoje a pouco mais de um quarto do americano. Em 1980, equivalia a quase 40%. Nesse período, o PIB per capita do Chile passou de 27,4% para 41,5% do indicador dos EUA; o da China, de 2,5% para 28,9% e o da Coreia do Sul, de 17,5% para 66%. Os números levam em conta o critério de paridade do poder de compra (PPP, na sigla em inglês), com base em estimativas do Fundo Monetário Internacional (FMI).
Coordenador de economia aplicada do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV), Armando Castelar diz que o Brasil está ficando mais pobre em termos relativos, na comparação com outros países. O país fica mais longe dos países de renda alta, como os EUA, em vez de ficar mais próximo. Nesse sentido, é um processo inverso ao desenvolvimento, afirma ele. “É um processo de subdesenvolvimento não em relação a si mesmo, mas em relação ao resto do mundo.” O critério de paridade de poder de compra busca eliminar as diferenças de custo de vida, facilitando a comparação entre os países.
Em 1980, o PIB per capita brasileiro era de US$ 11.372, equivalendo a 39% do americano. Em 2018, era apenas 26% maior do que em 1980. Os US$ 14.359 do ano passado equivalem a 25,8% do PIB per capita dos EUA. No mesmo período, o PIB per capita sul-coreano cresceu 623%, e o chileno, 189%. O indicador americano, mesmo partindo de um nível bem mais alto em 1980, aumentou 91% nesse intervalo.
O desempenho do PIB per capita brasileiro recente tem sido ainda pior. Nos últimos anos, o país sofreu uma gravíssima recessão, que durou do segundo trimestre de 2014 ao quarto trimestre de 2016, e a economia cresceu apenas 1,1% em 2017 e também em 2018. Depois de bater no pico de US$ 15.562 em 2014, o PIB per capita do Brasil recuou nos três anos seguintes, ficando praticamente estável no ano passado, quando subiu 0,4%.
Como o Brasil tem nível de renda bastante inferior ao de países desenvolvidos, o país não deveria ter dificuldade em ganhar terreno em relação a essas economias, observa o economista Celso Toledo, diretor da LCA Consultores. “Essa é a ideia da convergência, mas o Brasil está ficando mais longe da fronteira [dado por indicadores como o nível do PIB per capita dos EUA, por exemplo]”, diz ele.
Toledo diz que o Brasil é menos competitivo e menos produtivo que muitos outros emergentes, que crescem a um ritmo mais forte. Segundo ele, a economia brasileira é pouco amigável aos negócios, como fica claro pelas características do sistema tributário, marcado por enorme complexidade. Além disso, o país é muito fechado ao comércio exterior e tem uma situação fiscal bem mais complicada do que muitos países de renda média.
Estudo da McKinsey ilustra bem o mau desempenho da produtividade brasileira na comparação com outros países no período de 1990 a 2018. Nessas quase três décadas, a produtividade do trabalho cresceu apenas 1,3% ao ano no Brasil, bem abaixo dos 3% do Chile, dos 5% da Índia e dos 8,8% da China, de acordo com a consultoria.
Aumentar o ritmo de expansão da produtividade, como se vê, será essencial para o país conseguir crescer a um ritmo mais expressivo. Isso é ainda mais importante dada a demografia do país. Castelar lembra que o bônus demográfico no Brasil terminou, uma vez que a população em idade de trabalhar passou a crescer a um ritmo inferior ao da população total. Isso significa que se encerrou a fase mais favorável da estrutura etária do país ao crescimento. Acelerar a expansão do PIB dependerá fundamentalmente de o Brasil tornar a economia mais produtiva.
Para Castelar, um dos principais caminhos para isso é o país aumentar o investimento, tanto público quanto privado. É preciso ajustar as contas públicas, para que o governo possa investir mais, e é necessário melhorar o ambiente de negócios, para que o setor privado fique mais confiante para apostar em projetos de modernização e expansão da capacidade produtiva.
Castelar chama a atenção para o caso da Coreia do Sul, cujo PIB per capita equivale hoje a dois terços do americano. Há quase quatro décadas, o indicador brasileiro era mais que o dobro do sul-coreano. Nesse período, o país asiático fez maciços investimentos em capital físico e capital humano, lembra ele. Segundo números do FMI, a Coreia do Sul investe o equivalente a 30% do PIB. Em 2018, a taxa de investimento do Brasil foi de apenas 15,8% do PIB.
O mau desempenho dos alunos brasileiros em testes como o Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa, na sigla em inglês) é um sinal negativo para a trajetória futura do PIB per capita do país. Toledo lembra que os resultados obtidos por estudantes de outros países, como a China e o Vietnã, são muito melhores que os Brasil. “Esse é um dos fatores que vão determinar o crescimento daqui a 20, 25 anos”, observa ele. Nesse quadro, o país pode ficar preso na chamada armadilha de renda média. Este é o destino de muitos emergentes que, depois de passar do nível de renda baixa para o de média, não conseguem atingir o estágio de rendimento alto.
O PIB per capita é muito utilizado para comparar níveis de riqueza entre países, calculado pela divisão do valor do PIB pela população total. O indicador que aparece nesta reportagem é o do critério de paridade do poder de compra, a preços constantes, em dólares de 2011 – o ano-base mais recente usado pelo Programa de Comparação Internacional, em relatório divulgado pelo Banco Mundial em 2014, com uma ampla análise dos dados do PIB por PPP de 199 países.
https://valor.globo.com/brasil/coluna/brasil-perde-terreno-na-corrida-do-pib-per-capita.ghtml
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