Paulo Saldaña – Dados do IBGE mostram que abandono escolar atinge mais população negra.
Concluir a educação básica ainda é realidade distante para muitos jovens brasileiros, mas o problema atinge com maior intensidade a população negra.
Um terço dos brasileiros entre 19 e 24 anos não havia conseguido concluir o ensino médio em 2018. Apesar da média geral já ser alta (e cujo percentual é similar entre jovens brancos), o panorama entre os negros é ainda pior: quase metade (44,2%) dos negros homens dessa faixa etária não concluiu a etapa.
Os recortes por cor de pele e gênero revelam outros abismos: 33% das meninas negras nessa idade não têm ensino médio, enquanto o índice é de 18,8% entre as brancas.
O cenário relacionado ao ensino médio é só uma ponta do desafio, que começa mais cedo. Ser negro no Brasil aumenta a chance de exclusão escolar ao longo da educação básica, como mostram dados da mais recente PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), relacionado a 2018. As informações do IBGE foram tabuladas pelo Instituto Unibanco para a Folha.
O abandono escolar é um dos maiores entraves educacionais do país, o que tem forte relação com as altas taxas de reprovação. E desde o ensino fundamental essa conjectura incide de forma mais acentuada sobre a população negra.
Enquanto, na média, 13,1% dos jovens de 19 a 24 anos não haviam concluído o 9º ano do fundamental, entre os negros o percentual era de 19%.
Desigualdades raciais são identificadas também entre aqueles que estão na escola na idade indicada para o ensino médio, de 15 a 17 anos. Entre os brancos, 16,6% não tinham passado do 9º ano. Esse índice é de 25,5% entre pretos e pardos.
Também há mais negros dessa faixa etária que, atrasados, ingressaram em escolas para Jovens e Adultos, o EJA. Mais de seis em cada dez estudantes da modalidade são negros.
Os dados corroboram a existência de traços estruturais de discriminação. E os próprios jovens sentem na pele os reflexos das desigualdades de oportunidades.
Nascido em Cabeceiras (GO), Samuel Marques abandonou a escola na 8ª série. Precisava trabalhar e os horários do emprego, uma cafeteria em Brasília, eram incompatíveis com os da escola.
Só aos 19 anos retomou os estudos em uma escola de EJA e, aos 23, deve terminar o ensino médio neste ano. “É mais difícil para um negro arrumar emprego, ainda mais se você tiver cabelo grande, estilo afro, se fugir do padrãozinho. A gente sente uma cultura de racismo”, diz.
A mãe é varredora de rua e o pai, pedreiro. Marques mora numa cidade satélite da capital federal e leva uma hora pra chegar ao Plano Piloto, onde estuda. Perto da sua casa não havia vagas em EJA.
“Quem tem mais privilégios pode só estudar, fazer outros cursos junto com a escola, estuda perto de casa, enquanto muita gente ou trabalha ou passa fome”, diz.
Os dados mostram que o percentual de jovens de 15 a 17 anos que só trabalham e não estudam é maior entre os negros (5,7%), ainda que próximo à realidade dos brancos (4,9%).
O superintendente do Instituto Unibanco, Ricardo Henriques, diz que a definição das causas dessas desigualdades exige maiores estudos, mas a recorrência de evidências indica processos estigmatizantes e estruturais.
“Pode ser estigma dos professores [com relação aos jovens negros, como a indisciplina], práticas cotidianas de exclusão, ambientes autorreferidos que produzem preconceito, leituras pretéritas que não são educacionais, e provavelmente uma combinação de todos esses fatores”, diz.
“É necessário um olhar para a diversidade, que favoreça um cotidiano na sala de aula que reconheça as diferenças, que tenha missão de igualdade de oportunidade ao longo do processo. Dado que as características de exclusão são estruturais, não adianta achar que zera o jogo no primeiro dia de aula”, diz. “A missão da escola é entregar à sociedade uma situação de excelência com equidade”.
https://www.geledes.org.br/4-em-cada-10-jovens-negros-nao-terminaram-o-ensino-medio/
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