Weez – A escravidão existiu em Portugal, mas de maneira marginal e temporária, já no Brasil a instituição da escravidão foi essencial para moldar a nossa cultura.
Sempre, desde pequenos, nós escutamos que a sociedade brasileira foi moldada pela cultura portuguesa. Principalmente quando se trata de explicar o Estado brasileiro: algo inevitavelmente corrupto e patrimonialista, logo uma autêntica herança da terra de Afonso Henriques.
Contudo, nossa cultura não foi moldada em Portugal; foi moldada é na escravidão.
A escravidão existiu em Portugal, mas de maneira marginal e temporária. Não foi determinante para moldar a alma do povo lusitano que efetivamente vive na terrinha. Já em terras do Pau Brasil, do Café, da Cana de Açúcar e da Soja, a instituição da escravidão foi essencial para moldar nossa alma, inclusive a da nossa elite: tacanha, autoritária, mesquinha, machista, racista e, principalmente, devota da rapinagem e dos ganhos de curto prazo.
Para não ter mal entendido, vamos lembrar quem de fato pertence a essa classe: os donos de grandes latifúndios e das poucas indústrias brasileiras que nos sobraram; os altos executivos, os administradores e os gerentes; os grandes banqueiros e os donos da nossa mídia. Enfim, estamos falando do 1% e não da classe média que se considera uma elite em potencial por poder fazer viagens para Miami, levar os filhos na Disney e poder comprar produtos com valores superfaturados no Brasil em busca de exclusividade. Estamos falando aqui daqueles que de fato detêm o poder econômico no Brasil.
No Brasil, a lei que vale é a lei do rico e do grande senhor de terras. Desde a colônia, o poder dos que realmente se encontram no andar de cima é quase ilimitado. Fazem e desfazem a lei quando querem. Colocam e retiram representantes políticos quando lhes dá na telha. Olham para o povo brasileiro e vêem apenas um bando de animais selvagens que só servem para serem explorados – visão muito parecida com a da classe média em relação ao povão.
Família Marinho, uma autêntica representante da elite brasileira: monopoliza os meios de comunicação, possui mansão em área de reserva ambiental e, de acordo com processo da Receita Federal, sonegou mais de R$ 615 milhões.
Desde a colônia, essa elite moldada no tráfico de escravos e no latifúndio (como a família do atual prefeito da cidade de São Paulo, o João Doria Junior) não tem um projeto de nação, de Brasil. Essa elite olha para o país e vê apenas material para ser rapinado, explorado e para se tirar todos os lucros e ganhos possíveis no mais curto prazo.
A elite brasileira é uma elite de Terra Arrasada: exploram, rapinam, destroem, exploram mais e, no final, deixam tudo para trás e vão viver em alguma ilha privada. Ou seja, a elite brasileira é a elite da lógica do capitalismo levada ao extremo. É a elite da pura exploração e rapinagem, sem projeto, sem visão de desenvolvimento capitalista. É uma elite formada na violência crua da escravidão e do tráfico humano mais revoltante. É uma elite repugnante, desumana, o lixo do lixo entre a elite mundial. E nós – todos nós – os 210 milhões de habitantes desse cemitério de vivos chamado Brasil, estamos submetidos aos caprichos dessa classe que se perfuma com Clive Christian enquanto o povo sofre as consequências de viverem em um país com uma das maiores desigualdades sociais do mundo.
Diante dessas características daqueles que estão no topo da nossa pirâmide social, qual é a base do senso comum para dizer que o Estado brasileiro é descendente de um pretenso Estado corrupto e patrimonialista português? Essa conversa é totalmente anacrônica, pois o “Estado” medieval e o Estado Absolutista eram basicamente Estados privados.
Não havia em Portugal – como não havia em nenhuma monarquia do início da modernidade europeia – a ideia de que a soberania e as riquezas do país pertenciam ao povo, ao público. O Estado e a Soberania eram privados. Essa noção de que nosso Estado Nacional é intrinsecamente corrupto, de compadrios nepotistas e patrimonialista, por conta de uma herança genética originária de Portugal, só serve a um propósito: demonizar qualquer tentativa de utilização do Estado para o bem público e para o desenvolvimento nacional.
Tal narrativa simplista, por outro lado, define o Mercado como o lugar da racionalidade, da impessoalidade, como aquilo que não é utilizado de maneira corrupta por ninguém, que não serve aos interesses pessoais de ninguém e que é o espaço da lei e da justiça. Essa ideologia é a mesma que pinta o brasileiro e os latinos em geral, como avessos à lei, entregues às emoções e à sexualidade, como aqueles que sempre querem ajudar os seus amigos e familiares desrespeitando a lei racional, que resolvem tudo no “jeitinho”, corruptos e malandros por natureza.
Isto é, uma visão que pinta os brasileiros e o Estado Brasileiro como animalizados, impossibilitados de seguirem a razão. Como inerentemente incapazes de seguirem as leis e a impessoalidade que se pedem numa democracia. Opostamente aos brasileiros e ao Estado, estariam os povos do Norte e o Mercado. Germânicos e Anglo-Saxões, assim como o Mercado, seriam aqueles que conseguem agir racionalmente, sem se deixarem levar pelas emoções e interesses pessoais. Incorruptíveis e moralmente superiores. Capazes do empreendedorismo, de soluções inteligentes, de ganharem o mundo por sua própria conta utilizando-se da razão em vez de, como os latinos, esperarem favores de compadres, amigos e comadres.
Ideologia… Só isso. Uma ideologia baseada em conversa fiada, sem respaldo histórico algum, que serve para legitimar o status quo e desqualificar tudo aquilo que poderia possibilitar uma transformação, como faz com a política. Uma conversa fiada que forma o nosso senso comum e por isso sempre explorada pela mídia e pelos conservadores. Mas vejam que é uma visão que vem da separação entre o espírito divinizado e o corpo animalizado, a qual faz parte da cultura ocidental.
https://voyager1.net/sociedade/a-elite-brasileira/
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