Sete sem-teto estavam em um dos vagões. Eles estavam deitados nos assentos, usando suas mochilas como travesseiros, protegidos por cobertores e carregando malas. Cena semelhante era vista vagão após vagão.
Um homem carregava um saco de lixo cheio de latas; outro cochilava ao lado de uma caixa de pizza. Um homem de bengala tirara suas botas encharcadas para secar as meias.
Há cerca de 3.900 sem-teto em Nova York, segundo as estimativas de 2017 —uma alta de 40% em relação a 2016. Quando o clima está normal, eles dormem nas ruas, em túneis, em viadutos e no metrô.
Mas em dias de frio intenso, eles descem ao metrô, que fica aberto e aquecido 24 horas por dia e transformam os vagões em abrigos sobre trilhos.
Não há contagem exata sobre o número adicional de sem-teto que buscaram refúgio em trens do metrô na recente onda de frio, mas a linha E serve como boa referência.
Há décadas ela é uma das linhas mais usadas pelos sem-teto para dormir, porque todo o seu percurso acontece embaixo da terra —de Jamaica Center, em Queens, ao World Trade Center, em Manhattan—, uma jornada de 50 minutos que protege os passageiros contra o frio.
Shanaira Hobgood, 25, estava deitada em um banco de trem da linha E. “É a primeira vez que durmo nos trens”, disse. Ela mora na rua ocasionalmente desde que deixou a casa da mãe, há sete anos, e ainda que tenha feito o supletivo do secundário e cursos na universidade, não consegue emprego.
Depois de uma passagem pelo sistema de abrigos da cidade foi parar no hospital, com depressão e pensamentos suicidas. “Passava os dias chorando.” Ela começou a dormir no trem há duas semanas, após notar que suas mãos estavam roxas de frio.
Pés de homem sem-teto que dorme em trem da linha E do metrô de Nova York devido a frio intenso
Há moradores de rua que preferem as linhas A e 1, cujos trajetos mais longos oferecem mais tempo para dormir. “Cada linha tem uma cultura”, disse Muzzy Rosenblatt, presidente do Comitê dos Residentes do Bowery, uma organização sem fins lucrativos que trabalha em parceria com a Autoridade de Transporte Metropolitano e a prefeitura e posiciona assistentes sociais em diversas estações de metrô e de trens de subúrbio.
“As pessoas que sofrem de doenças psiquiátricas desenvolvem técnicas de sobrevivência e sabem que sua melhor aposta é a linha E”, disse. “Na linha 1, temos mais pessoas viciadas em álcool e drogas; elas se preocupam menos com o clima.”
No domingo, o Serviço Meteorológico Nacional dos EUA havia lançado um alerta de que a sensação térmica podia cair a -20ºC. Os sinais da população noturna de sem-teto já se acumulavam —garrafas vazias de bebidas alcoólicas, uma pulseira hospitalar, pilhas de lenços de papel.
Um homem mais velho, na linha A, havia amarrado um carrinho de bagagem com suas posses a uma das barras de apoio do vagão, enquanto dormia.
Na linha E, os 45 sem-teto foram chegando: o sujeito com o saco plástico cheio de latas, homens que cheiravam mal, mas também jovens —um homem barbado, em jeans largos, carregando um gatinho; uma jovem usando calças finas com uma mala dilapidada. Lentamente, eles buscaram assentos nos quais pudessem dormir.
“O trem inteiro está ocupado pelos sem-teto”, disse Christopher Mendoza, supervisor de campo de uma companhia de segurança que fez o turno noturno do domingo.
Quando o trem chegou ao World Trade Center, uma gravação avisou pelos alto-falantes que “esta é a última parada. Por favor desembarquem”. Nenhuma das pessoas que estavam dormindo desceu.
http://m.folha.uol.com.br/mundo/2018/01/1949329-metro-vira-abrigo-sobre-trilhos-para-sem-teto-em-nova-york-gelida.shtml
Deixe uma resposta