MARK MAZZETTI – O Congresso norte-americano levou a público nesta sexta-feira (15) um documento que passou anos em sigilo e que detalha possíveis ligações entre o governo saudita e o complô terrorista do 11 de setembro de 2001.
O documento de 28 páginas é um catálogo abrangente de alegados vínculos entre autoridades sauditas e agentes da Al Qaeda, desde contatos que agentes sauditas no sul da Califórnia tiveram com os sequestradores até um número telefônico encontrado com o primeiro prisioneiro da Al Qaeda em custódia da CIA, que o FBI rastreou e descobriu ser de uma firma que administrava uma residência no Colorado do príncipe Bandar bin Sultan, o então embaixador saudita em Washington.
O documento, que faz parte de um inquérito do Congresso de 2002 sobre os ataques de 11 de setembro, foi mantido em segredo até agora devido ao receio de que pudesse desgastar as relações diplomáticas entre os EUA e a Arábia Saudita.
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Sua divulgação assinala o fim de uma luta travada durante anos por legisladores e as famílias das vítimas do 11 de setembro para levar a público qualquer evidência de que a Arábia Saudita pudesse ter exercido um papel nos ataques.
A maioria dos fatos em torno dos ataques não é objeto de contestação séria, mas a controvérsia duradoura em torno do possível papel desempenhado por autoridades sauditas serve para lembrar que alguns mistérios permanecem, mesmo agora, quando o 15º aniversário dos ataques se aproxima.
A administração Obama enviou à liderança do Congresso uma versão não sigilosa do documento, com alguns cortes, na sexta-feira. Horas mais tarde o documento foi postado no site na internet do Comitê de Inteligência da Câmara dos Deputados.
Boa parte da pressão exercida ao longo de mais de dez anos para liberar a divulgação do documento foi liderada pelo ex-senador democrata Bob Graham, da Flórida, que foi um dos copresidentes do inquérito congressional. Graham disse por muito tempo que a divulgação do documento traria provas convincentes de que o governo saudita teve participação direta no complô terrorista.
Mas o documento também é, até certo ponto, uma curiosidade histórica. As 28 páginas foram mantidas em sigilo por tantos anos que seu significado parece ter sido amplificado pelo tempo. Investigações subsequentes conduzidas pela comissão do 11 de setembro e o FBI estudaram muitas das pistas presentes nas 28 páginas e constataram que algumas delas não têm base factual.
Em entrevista dada no mês passado, Eleanor J. Hill, diretora de pessoal do inquérito congressional, descreveu as 28 páginas como “um resumo das informações dadas às agências para serem investigadas mais extensamente”, e não uma lista de conclusões firmes. O complô do 11 de setembro ainda é uma investigação em aberto do FBI.
Em seu relatório final, divulgado em 2004, a comissão do 11 de setembro disse que não encontrou evidências de que “o governo saudita, como instituição, ou autoridades sauditas seniores, individualmente, tenham financiado” a Al Qaeda.
Mas alguns membros da comissão observaram que os termos do relatório não excluíram a possibilidade de que funcionários sauditas de escalão inferior tivessem auxiliado os terroristas. Disseram que a comissão trabalhou sob forte pressão de tempo e não conseguiu investigar todas as pistas.
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Alguns investigadores continuaram perplexos, em especial, pelo papel exato desempenhado por Fahad al-Thumairy, funcionário consular saudita que vivia na área de Los Angeles na época dos ataques. Eles acreditam que, se houve algum envolvimento do governo saudita no complô, é provável que tenha passado por ele.
Thumairy era o imã de uma mesquita visitada por dois dos sequestradores do 11 de setembro, e alguns funcionários do governo americano desconfiam há anos que Thumairy tenha dado assistência aos dois homens -Nawaq Alhamzi e Khalid al-Mihdhar- depois de chegarem a Los Angeles, no início de 2000.
Um documento do FBI de 2012 citado no ano passado por uma comissão independente de revisão concluiu que Thumairy “imediatamente designou uma pessoa para cuidar de al-Hazmi e al-Mihdhar durante o período que passaram na área de Los Angeles”, mas o FBI não conseguiu revelar outros detalhes sobre os movimentos dos dois homens em seus primeiros tempos nos Estados Unidos.
Dois investigadores da comissão do 11 de setembro entrevistaram Thumairy por várias horas na capital saudita, Riad, em fevereiro de 2004, mas ele negou ter tido qualquer ligação com os sequestradores, mesmo depois de lhe terem sido mostrado registros telefônicos que aparentemente o vinculavam aos dois homens.
No documento de 28 páginas é discutido o possível papel exercido por Thumairy, além de várias ligações possíveis entre agentes da Al Qaeda e funcionários sauditas. Uma seção do documento detalha como um número telefônico em uma caderneta de telefones encontrada com Abu Zubayda, capturado pela CIA no Paquistão em março de 2002, revelou ser de uma corporação em Aspen, Colorado, “que administra a residência do príncipe Bandar no Colorado”.
Abdullah al-Saud, o embaixador saudita nos Estados Unidos, disse em comunicado na sexta-feira que a Arábia Saudita “saúda a divulgação” do documento.
“Desde 2002, a Comissão do 11 de setembro e várias agências governamentais, incluindo a CIA e o FBI, investigaram o conteúdo das ’28 páginas’ e confirmaram que nem o governo saudita, nem funcionários seniores sauditas, nem qualquer pessoa agindo em nome do governo saudita deram qualquer apoio ou incentivo a esses ataques”, disse o embaixador.
http://m.folha.uol.com.br/mundo/2016/07/1792284-documento-secreto-sobre-119-detalha-possivel-ligacao-saudita-com-al-qaeda.shtml
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