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Ressentimento com globalização impulsionou votação por Brexit

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FERNANDA ODILLA – A decisão do Reino Unido de deixar a União Europeia mostrou ao mundo que existe um grupo que se sente cada vez mais excluído e insatisfeito com as prerrogativas da globalização.

Ao se unir aos radicais de uma direita xenófoba, representada pelo partido anti-imigração Ukip, e a conservadores historicamente céticos em relação à Europa, esse grupo de insatisfeitos ajudou a assegurar os 17,4 milhões, ou 52%, de votos que deram a vitória ao “Brexit”.

Oriundo da fusão das palavras em inglês “britânicos” e “saída”, o termo Brexit representa o rompimento histórico do Reino Unido com a União Europeia – bloco de 28 países do qual os britânicos faziam parte desde 1973.

O professor Octávio Ferraz, da faculdade de direito do King’s College London, observa que essa grande massa de indignados com, nas palavras dele, o “mundo maravilhoso da globalização que a UE representa” é composta principalmente por pessoas mais pobres.

“Esse sentimento certamente se exacerbou com o aumento da desigualdade e se acirrou ainda mais com as políticas de austeridade dos últimos anos. Surge, portanto, uma interessante combinação de vozes diversas. Alguns focam nos imigrantes, outros no governo, outros nas megaempresas e nos bancos. Mas todos cantam em uníssono o hino do Leave [“sair”]”, observa Ferraz.

SIMPLES E DIRETO

Nem mesmo os estudos econômicos, cuja maioria previu perdas significativas para a economia britânica, foram capazes de dissuadir os favoráveis ao Brexit.

A campanha anti-UE conseguiu mobilizar esse grupo de insatisfeitos com mensagens simples e de apelo direto. Elas ressaltavam, por exemplo, que os países mais ricos e bem sucedidos da Europa, como Suíça e Noruega, não fazem parte do bloco.

Um dos panfletos distribuídos pela campanha dos que apoiavam a saída dos britânicos da União Europeia estampava o texto: “se pararmos de mandar milhões toda semana para Bruxelas, poderíamos gastar o dinheiro com nossas próprias prioridades”.

Para muita gente, em especial os que defendiam o rompimento com o bloco, esse investimento contradiz a política de austeridade imposta com vigor pelo governo britânico desde a crise econômica global iniciada em 2008.

Nos oito anos que se passaram desde a crise do mercado financeiro, o Reino Unido conseguiu recuperar seus principais indicadores macroeconômicos, mas não conseguiu reduzir desigualdade social nem apresentar uma perspectiva promissora à população mais jovem.

Uma mão de obra cada vez mais qualificada passou a ter menos oportunidades de emprego, conforme indica um estudo conduzido pelo Centro para Análises de Exclusão Social da LSE (London School of Economics). Em oito anos, os empregos em horário integral para jovens de 20 a 24 ambos caíram 10%.

IRONIA

O sucesso do Reino Unido fora da UE depende, contudo, de sua capacidade de negociar acordos a curto e médio prazo. Apesar de o bloco europeu pressionar o governo britânico a dar início imediato ao processo de saída da EU, ainda há muita incerteza em relação a como e quando ele será finalizado.

Não há garantias, contudo, de que as insatisfações desse novo grupo de descontentes serão sanadas.

“A ironia é que, com exceção talvez da imigração, um governo conservador inglês fora da UE pode ser ainda mais globalizador”, observa o professor Octávio Ferraz.

Segundo ele, há também a possibilidade, “talvez um tanto utópica, de uma virada mais à esquerda quando ficar mais claro que a saída do bloco não resolverá os problemas contra os quais esses grupos parecem ter votado”.

REINO UNIDO E UE

O peso do bloco na economia britânica

Números do Reino Unido

65 mi – População

5,4% – Desemprego

US$ 2,9 tri – PIB

US$ 40.676 – PIB per capita

0,5% – Inflação


67,8 bi de libras foi o deficit do Reino Unido com a UE em 2015


R$ 4,97 – era a cotação da libra em relação ao real nesta segunda (20)

http://m.folha.uol.com.br/mundo/2016/06/1785724-ressentimento-com-globalizacao-impulsionou-votacao-por-brexit.shtml

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