Política

Não basta encontrar apoio no eleitorado: as dificuldades de Bolsonaro e Marina Silva na obtenção de apoio político

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Victor Picchi Gandin – Enquanto Geraldo Alckmin (PSDB) está prestes a oficializar uma controversa porém pouco surpreendente aliança com os partidos do chamado “Centrão”, a esquerda reluta em lançar um único candidato a presidente, manifestando esta vontade no plano teórico e mantendo ao mesmo tempo pré-candidaturas de diversos partidos diferentes. Entre o fisiologismo que se apresenta como centrista e a incerteza da esquerda, Jair Bolsonaro (PSL) e Marina Silva (Rede) encontram dificuldades ainda maiores nas negociações para a composição de suas respectivas chapas e coligações eleitorais.

Nas pesquisas de intenção de voto mais recentes, Bolsonaro e Marina figuram respectivamente na primeira e segunda colocação em cenários sem Lula, deslocando-se para o segundo e terceiro lugar quando o ex-presidente, que mesmo preso deseja manter sua pré-candidatura, é testado. Até o momento, apesar de as convenções já terem se iniciado, todo mundo ainda é pré-candidato. Tardiamente, devido a alterações no calendário eleitoral, dadas pela “reforma política” de 2015, todos os candidatos de 2018 só serão efetivamente conhecidos e registrados até o dia 15 de agosto (e não mais no dia 05 de julho), quando também saberemos qual nome será oficialmente o candidato do PT, quais serão os candidatos a vice-presidente e quais serão as coligações realmente válidas para o pleito de 07 de outubro.

Em parte, o novo calendário eleitoral é responsável pela falta de definições claras que encontramos sobre candidaturas e coligações neste momento. Independente de datas, porém, nada mais natural que partidos e políticos busquem formar alianças viáveis antes do registro de candidaturas e antes do segundo turno das eleições. Nisto, Bolsonaro e Marina Silva apresentam dificuldades particulares. Ambos enfrentam contratempos e correm contra o tempo para não ficarem isolados na disputa. O fato de estarem em partidos pequenos e terem dificuldades de formar articulações com outros partidos políticos permite-nos colocar numa mesma escala de comparação estes candidatos que são tão diferentes em ideologias e opiniões.

Antes de chegar ao PSL e ocasionar a saída da corrente “Livres” que se formava em seu interior na intenção de renovar a legenda, Bolsonaro esteve “namorando” o PSDC, de José Maria Eymael, partido que afirmou em nota não haver “interesse da Democracia Cristã” pelo nome do deputado. Após o fim do namoro que nem começou, Bolsonaro afirmou estar em “um noivado nota 10” com o PEN. Antes mesmo da filiação oficial, porém, Bolsonaro terminou mais um relacionamento efêmero, não antes de conseguir que tal partido se descaracterizasse totalmente apenas para abrigar sua candidatura, mudando até de nome e estatuto, ignorando características regionais e locais, o que pode até mesmo contribuir para um possível fim da legenda. Sem a intenção de grandes legendas lançarem seu nome, já filiado ao PSL e acreditando que tem força suficiente para vencer as eleições sem grande estrutura de apoio político, Bolsonaro encontrou na filiação a um partido pequeno uma saída para que pudesse controlar uma legenda antes de se lançar candidato.

Após seu estabelecimento no PSL, porém, outras dificuldades apareceram e ficaram claras na escolha do candidato a vice-presidente. O nome de Joice Hasselmann foi um dos primeiros a serem cotados. Todavia, a jornalista paranaense que quer ser candidata em São Paulo e omite já ter sido filiada a outro partido acabou comprando briga com o PSL, após tentar lançar-se pré-candidata ao governo de SP antes de uma anuência do partido. Uma articulação maior vinha ocorrendo e poderia dar maior estrutura e tempo de televisão a Bolsonaro: uma coligação com o PR (cortejado por praticamente todos os principais candidatos a presidente), tendo como candidato a vice o senador Magno Malta. O deputado federal Capitão Augusto (PR/SP) recorreu à mesma metáfora para se referir a esta possibilidade: “é um namoro sério, quase um noivado”. Porém, tudo não passou de outra relação que terminou antes de começar. O PR não se coligou ao PSL, buscando colocar Josué Alencar como vice em outra chapa presidencial, enquanto Magno Malta (PR/ES) preferiu disputar sua reeleição para senador.

Sem conseguir a aliança com o partido de Valdemar Costa Neto, que possui uma bancada de 40 deputados, cinco vezes maior que a do PSL, restou à Bolsonaro aproximar-se do nanico PRP, que não possui nenhuma cadeira na Câmara. O alarde foi o mesmo de sempre: Bolsonaro afirmou que “muito possivelmente” anunciaria um general como seu vice, e este seria Augusto Heleno, filiado ao PRP, partido que recusou a composição da aliança. Com frágil articulação política, pouco apoio partidário e mostrando inabilidade em conversas com outros partidos e políticos, restou a Bolsonaro tentar formalizar uma “chapa pura”, com um candidato do PSL sendo vice do candidato do PSL. Porém, mesmo assim o presidenciável esbarra em dificuldades. A advogada Janaína Paschoal teve oportunidade de assumir o posto, mas seu discurso em convenção partidária assustou aliados, que já chegam a rejeitar este nome da própria legenda de Bolsonaro.

Ao mesmo tempo em que Bolsonaro pena para conseguir partidos e políticos que o apoiem e o sustentem em um eventual governo, Marina Silva (Rede) sente o peso de ter deixado o PV e posteriormente o PSB em direção ao sonho de construir sua própria legenda. Caso tivesse continuado no PSB, onde seria vice de Eduardo Campos e assumiu protagonismo após seu falecimento em 2014, Marina Silva teria a estrutura necessária para uma nova candidatura presidencial, o que a Rede não a fornecerá. O partido teve seu teste inicial nas eleições municipais de 2016, quando não obteve sucesso e mostrou que, ao contrário dos discursos parlamentares de seus principais representantes na Câmara à época, não tem uma distinção ideológica clara, fechando nos municípios alianças com praticamente todos os partidos brasileiros, do PCdoB ao PSC. Hoje a situação é ainda pior, pois deputados saíram da Rede, que ficou representada por apenas por dois parlamentares, João Derly e Miro Teixeira. Com esta bancada, as emissoras de televisão nem mesmo tem obrigação de convidar Marina Silva a debates (embora isso deva acontecer devido à sua trajetória como candidata a presidente e seus percentuais de intenção de voto). Para piorar sua situação, neste ano começa a vigorar uma cláusula de barreira gradual, e a Rede pode não conseguir eleger um número mínimo de parlamentares, o que colocaria em risco a própria existência do partido.

Penso que a dificuldade de Marina Silva obter apoios em torno de sua terceira candidatura presidencial decorre de sua não muito bem-sucedida aposta na criação de uma nova legenda, já que certamente a candidatura teria mais estrutura e palanques estaduais caso fosse amparada por uma grande legenda como o PSB (foram seis partidos pequenos e médios em sua coligação em 2014). Além disso, a candidata por vezes perde o “timing”, tomando estratégias erradas nas horas erradas. Por exemplo: quando virou cabeça-de-chapa por causa do falecimento do Eduardo Campos em 2014, não aceitou aparecer em propagandas eleitorais ao lado de Alckmin, do PSDB, sendo que o vice do então governador de São Paulo, Márcio França, é do mesmo partido de Marina e o PSDB era aliado do PSB em São Paulo. Quando virou candidata em meio à eleição e precisava mostrar que era presidenciável e divulgar até mesmo seu número, Marina Silva resolveu ser programática e não apareceu ao lado de políticos tradicionais de outros partidos nem mesmo em “santinhos”, o que seria algo natural devido às alianças regionais que existiam entre os partidos naquela época. Porém, no segundo turno, quando já estava fora da disputa, não precisava mais de votos e não precisava fazer mais absolutamente nada na campanha, declarou apoio público a Aécio Neves, do mesmo PSDB… Este erro duplo chegou a afetar sua imagem. Quando o apoio do PSDB poderia ajudá-la, foi ignorado. Quando não era mais necessário, Marina tomou partido publicamente.

Para as eleições 2018, segundo matéria do jornal O Estado de S. Paulo, Marina Silva vem conversando com partidos como PV, PHS, PPS e PMN. Porém, até o momento não formalizou nenhuma aliança. Conversas também ocorrem com o PROS, outro partido pequeno, que poderia dar à sua chapa o ex-deputado pernambucano Maurício Rands ao posto de vice. Porém, se esta coligação com o partido que hoje tem 11 deputados não andar, à Rede Sustentabilidade pode também restar apenas a formação de uma “chapa pura”, tendo filiados do mesmo partido como candidatos a presidente e vice-presidente. Nomes como o do presidente do Flamengo, Eduardo Bandeira de Mello, e do economista Ricardo Paes de Barros, considerado um dos “pais” do Bolsa Família, foram ventilados pela mídia. Durante uma transmissão ao vivo no Facebook, Marina reconheceu que a escolha de um nome de seu próprio partido pode ser uma decorrência da dificuldade da Rede em formar uma coligação para o Executivo nacional: “Vamos, se não for possível [uma aliança com partidos] ter um vice que é a prata da casa ou ouro da casa. Temos bons nomes: o nome do Miro (Teixeira), Bandeira de Mello, o economista Paes de Barros”.

Ainda sem partidos em sua coligação, a Rede liberou diretórios estaduais para tocarem suas próprias alianças, com vistas à eleição de ao menos nove deputados federais em nove estados diferentes, o que garantiria a sobrevivência do partido. Esta é uma preocupação legítima tanto no caso do PSL quanto no caso da Rede Sustentabilidade: além da disputa presidencial, todos os partidos devem prestar atenção aos pleitos proporcionais caso queiram disputar também as próximas eleições. Uma cláusula de desempenho gradual será iniciada nas eleições deste ano.

A campanha eleitoral de 2018 está batendo à porta. Logo teremos, enfim, o registro das candidaturas, o início do horário eleitoral, sua divisão de segundos na televisão e a disputa do primeiro turno. As situações expressas nesta análise podem mudar, porém, neste momento são nítidas as dificuldades de dois candidatos tão diferentes, Bolsonaro e Marina Silva, obterem apoio político. Tais candidatos encontram apoio em parcelas consideráveis do eleitorado brasileiro, mas o mesmo não acontece em duas arenas tão importantes: a arena eleitoral (onde já penam para conseguir apoios de outros partidos políticos para a eleição que se avizinha) e a arena decisória (onde qualquer presidente eleito necessitará de apoio legislativo). O cientista político italiano Angelo Panebianco nos mostra que as arenas são ambientes que exercem influência direta sobre os partidos e estas são interdependentes. O sucesso obtido em uma arena, como a arena eleitoral, pode ajudar em outra, a arena parlamentar (decisória). No caso de nossa análise, podemos dizer que uma fragilidade na obtenção de apoios eleitorais (coligações) pode levar um partido a compor uma frágil coalizão de governo, ou, no mínimo, trazer dificuldades de governabilidade, independentemente da ideologia ou do partido do chefe do poder Executivo.

Como Marina ou Bolsonaro lidariam com esta questão num eventual governo? Para uma “nova política”, a aceitação de apoios pragmáticos e do sempre presente PMDB não parece razoável. Usar arbitrariedades ou querer indicar uma dezena de novos ministros ao Supremo Tribunal Federal (STF) também não substituiria a falta de apoio político de quem quer ser presidente do Brasil. Porém, esta questão fica para um outro momento. Neste, os partidos políticos devem oficializar seus candidatos e coligações e no próximo passo o eleitor deve analisar as opções disponíveis, observando que aceitar qualquer apoio partidário não é uma situação ideal, mas que o isolamento político e a dificuldade em realizar articulações também representa um sério problema para qualquer político que deseje governar o Brasil.

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