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Petróleo, interesses americanos e o golpe na Turquia

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Diego Fernando Machado Garcia – A perspectiva do petróleo é ignorada pela mídia nacional e nós da América Latina não podemos ficar assistindo como as outras nações são invadidas.

Os recentes acontecimentos envolvendo uma suposta tentativa de golpe na Turquia não podem ser vistos isoladamente.  É preciso ter em conta todo o relevante quadro circunstancial e histórico, inclusive na relação com o último ataque na França. Fatos como esse estão sempre revestidos de uma série complexa e plural de movimentações e interesses.

Dentro do território turco, assim como em toda aquela delicada região, há diversos conflitos e investidas externas. Ainda assim, os interesses geoeconômicos e militares americanos parecem envolvidos. Há muito tempo os curdos, que se espalham também por Síria, Irã e Iraque, fronteiriços da Turquia, engrossam o rol de problemas na região.

Uma das perspectivas implícitas é a questão geopolítica do quadro em questão, pois a Turquia faz parte de uma região nevrálgica no mundo, fonte de históricos embates étnicos, religiosos, políticos, econômicos e militares. Um ponto relevante nesse sentido é a sua localização: na ligação entre o tenso Oriente Médio e a Europa e próximo à Rússia.

Os turcos fazem parte da OTAN, com proximidade aos americanos, portanto, e seus eternos “aliados” ingleses e franceses. Nesse sentido, cabe recordar o que a grande mídia não explicita: o projeto de um gasoduto Rússia-Turquia, que atravessará o Mar Negro, envolvendo a gigante russa Gazprom. O gasoduto não tem a aprovação dos EUA. Obama teria  exigido do presidente turco que ele se retirasse do projeto. Há pouco, Rússia e Turquia anunciaram novas conversações. Oito dias depois disso, em 2015, houve aquele ataque a um caça russo, derrubado na Turquia, o que levou a suspensão do acordo.

A única base militar da Rússia pelo mundo afora fica precisamente na Síria tradicional, compradora de armas russas. Os russos dispõe do porto de Tartus e acesso ao de Latakia, cujo projeto era converter em base naval.  Rússia, Estados Unidos, Inglaterra, França e também Israel têm fortes interesses nas jazidas de gás sírio e em um gasoduto, crítico para a Europa, que, para funcionar, depende da boa vontade síria. Sem esquecer de todo volume de petróleo na região. Atente-se para o fato de Rússia e Irã, dois sabidos desafetos históricos dos americanos e de potências europeias, terem as maiores reservas de gás do mundo.

A Total, francesa, e a British Petroleum (BP), estão desde 1990 explorando o gás das águas sírias, em disputa com Líbano e Síria. Já a França tem encontrado pretextos convenientes para insurgir militarmente na região como fez na Líbia, com motivação no petróleo,  justificado pelo “combate ao terrorismo’’. Israel, por sua vez, conseguiu deter as operações da BP, sob protestos do governo Tony Blair, a partir da vitória eleitoral do Hamas em 2006 (que passaria a controlar uma parte do litoral de Gaza onde há gás). Enquanto isso a França também continua vendendo armas à Arábia Saudita em parceria com os EUA, que derrama bilhões aos sauditas pelas circunstâncias como a ‘’caça’’ a Assad na Síria, mesmo sabendo de seus nexos com o Estado Islâmico, que, por sua vez, tem ligações com a Turquia.

Como lembra Armanian (2014): Os imensos campos de petróleo e gás de todo o Oriente Médio mediterrâneo são uma tentação para os Estados Unidos e para a União Europeia (UE). Depois do fracasso do Ocidente no projeto do gasoduto “Nabucco” – que diversificaria o fornecimento energético da UE com a importação de gás desde o mar Cáspio ao Mediterrâneo, evitando a Rússia – a UE considera mais viável o “Arab Gas Pipeline” (gasoduto árabe) com a participação da Síria, Jordânia e Líbano, que conectaria o gasoduto que se estenderia do norte da África à Turquia, pelo Mediterrâneo.  

E não menos importante, a intensão em desmontar a Rússia enquanto EUA e as potências europeias, com destaque para França e Inglaterra, ainda lucram vendendo armas. A Rússia faz parte, junto com o Brasil, do Brics, instituição que rivaliza com as políticas de austeridade do FMI e do Banco Mundial, patrocinadas por Estados Unidos e União Europeia. Isto significa uma ruptura com o paradigma do “Consenso de Washington”, que criou um nefasto mecanismo de aprisionamento dos países endividados. Em uma crise cambial ou em um contexto de instabilidade, um país solicita empréstimos para saldar os compromissos externos. O FMI empresta, mas exige privatizações, cortes de gastos públicos, redução dos direitos trabalhistas e arrocho salarial, a fim de garantir o pagamento da dívida. Assim, todo o “superávit primário” é direcionado ao pagamento da dívida, mesmo que isto signifique fome, miséria, desemprego e desindustrialização.

Assim, os BRICS constroem os alicerces de um novo ordenamento geopolítico que a imprensa brasileira, sucursal dos interesses estadunidenses, se recusa a noticiar para não desagradar seus patrões. A Venezuela sofre por possuir a maior reserva de petróleo do mundo e não estar alinhada aos estadunidenses e europeus. Criam pretextos para invadir países e roubar seus recursos.

Invadiram a sofrida Líbia por conta de gás e do petróleo, o mesmo com a Síria. A Venezuela está na mira e quem sabe à frente o Brasil e a Argentina.

Essa é a perspectiva ignorada pela mídia nacional e nós da América Latina não podemos ficar assistindo como as outras nações são invadidas e pilhadas, ou vamos acordar um dia com a IV Frota dos EUA e OTAN bem à frente de nossas costas preparados para invadir e roubar o petróleo (sob algum novo pretexto, o narcotráfico, por exemplo), o gás, a Amazônia e a água que pertence ao povo sul-americano.

REFERÊNCIA
ARMANIAN, Nazanín. Jihadistas na Casa Branca e os gasodutos da Eurásia. Carta maior. Disponível em: http://cartamaior.com.br/?%2FEditoria%2FInternacional%2FJihadistas-na-Casa-Branca-e-os-gasodutos-da-Eurasia-%2F6%2F31731&page=3

http://cartamaior.com.br/?/Editoria/Internacional/Petroleo-interesses-americanos-e-o-golpe-na-Turquia/6/36490

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