Sociedade

O que acontece quando agressores de redes sociais são expostos ao público?

Tempo de leitura: 8 min

Leonardo Sakamoto – Quando você posta algo em uma rede social ou em caixas de comentários de sites não está realizando uma conversa particular. Pelo contrário, fala em um megafone. E muita gente está lendo o que você disse. Da mesma forma, quando ataca alguém na rede, o seu discurso atinge muito mais gente do que imagina. E isso pode trazer graves consequências para a outra pessoa, mas também para você.

Cansado de receber ofensas por sua atividade parlamentar e por ser homossexual, o deputado federal Jean Wyllys (PSOL-RJ) resolveu expor, em suas redes sociais, ataques e ameaças que sofre e processar os autores. A condição para retirar esse conteúdo do ar e não prosseguir na Justiça é que o agressor apague sua postagem e faça, em seu perfil, um pedido público de desculpas.

Temendo repercussões em seus empregos, junto aos seus parceiros de negócios ou família, mas também dores de cabeça judiciais, muitos são os haters que têm procurado a assessoria do parlamentar. Ele conta, hoje, com mais de um 1,26 milhão de curtidas em sua página oficial do Facebook.

”Hoje eu avalio que demorei muito a tomar a decisão certa em relação a caluniadores, a divulgadores de calúnias e aos que me injuriam nas redes sociais. Essa decisão certa foi expor essas pessoas publicamente, fazê-las experimentar, por um período e apenas um pouco, as consequências de suas ações, inclusive as jurídicas”, afirma Jean.

De acordo com o deputado federal, os efeitos positivos foram imediatos. Primeiro porque muitas pessoas apagaram as calúnias e pediram desculpas públicas. Mas, além disso, outras tantas enviaram para a sua equipe mentiras e calúnias que estavam circulando sem que soubessem, o que permitiu agir contra outros autores e divulgadores.

”É importante frisar que tomei essa decisão porque não estava obtendo respostas suficientes nem no tempo necessário por parte da polícia, que, estranhamente, no caso da difamação contra mim tem se mostrado lenta demais.”

Ele acredita que as pessoas não têm ideia do estrago que as calúnias, mentiras e notícias falsas produzem na vida de suas vítimas e familiares e agem de modo irresponsável. ”Logo, fazê-las perder emprego, patrocínios, apoios e parceiros por conta de sua irresponsabilidade com a vida do outro é algo pedagógico, que vai levá-las a fazer um uso melhor e mais responsável das redes sociais e da vida dos outros.”

A decisão de Jean, que vai publicar, em breve, uma nova lista de seus difamadores, tem servido de exemplo para outras pessoas públicas vítimas do mesmo tipo de ataque.

Outro caso que ganhou repercussão recentemente foi o do jornalista James Cimino, que também é gay, acusado por um atleta de apoiar a pedofilia por ter criticado os ataques à performance que envolveu nu artístico no Museu de Arte Moderna de São Paulo. O lutador de MMA, que chegou a dizer ”Que venha Bolsonaro e que um verme igual a você morra”, acabou suspenso pelo Corinthians após a polêmica vir a público.

O clube até publicou uma nota em sua página o Facebook, lamentando o ocorrido: ”Em nome de todos os atletas, gostaríamos de pedir desculpa ao jornalista e a todos que se sentiram ofendidos. A opinião do atleta não condiz com a do restante da equipe. O atleta será suspenso por tempo indeterminado”. A nota também afirma que ”os valores empregados na equipe não incluem qualquer ato homofóbico ou opinião intolerante sobre qualquer que seja o assunto. Em tempos de ódio, guerra e violência, o Corinthians MMA não pode compactuar com uma postura inadequada como essa”.

Para James Cimino, ”as pessoas não estão abertas ao diálogo nem à compreensão. Estão histéricas e completamente descrentes das instituições, exceto das que endossam seu fanatismo”. Ele ressalta que foi novamente atacado e acusado de querer prejudicar o atleta na área de comentários do post em que a academia do Corinthians pediu desculpas.

Quando você posta algo em uma rede social ou em caixas de comentários de sites não está realizando uma conversa particular. Pelo contrário, fala em um megafone. E muita gente está ouvindo o que você disse. Da mesma forma, quando você ataca alguém na rede, o seu discurso atinge muito mais gente. E isso pode trazer graves consequência, para a outra pessoa, mas também para você.

James diz que não quer que o atleta seja demitido, nem deseja qualquer indenização pelo ocorrido, mas que ele se retrate em suas redes sociais e admita que o acusou sem provas. E se isso não ocorrer, irá processá-lo. ”Se o juiz entender que cabe uma indenização, eu vou doar ao MAM.”

Ele acredita que ações como a dele, de publicizar os ataques que sofre, vai incentivar mais pessoas a reagirem. ”Quando a gente acha que não vale a pena o esforço é que esse tipo de atitude ganha corpo, e eles se sentem invencíveis.”

Perder o emprego – Um copiloto da Avianca foi demitido, em março de 2014, por conta de comentários preconceituosos contra nordestinos em seu Facebook. “Para manter o padrão porco, nojento, relaxado, escroto de tudo no Nordeste como sempre”, escreveu sobre o atendimento de um restaurante em João Pessoa (PB), entre outras coisas. Depois da grande repercussão na rede, ele apagou o comentário e se desculpou. Mas, aí, já era tarde.

Um dos casos mais famosos de demissão por postagem em rede social foi o de uma diretora de comunicação da InterActibe Corp, que publicou um comentário racista antes de levantar voo para a África do Sul, em dezembro de 2013: “Indo para a África. Espero não contrair Aids. Brincadeira. Sou branca!”. Ela só tinha 200 seguidores no Twitter, mas a informação rodou o mundo. Quando pousou, descobriu que havia virado trending topic. Acabou demitida.

Um momento transformador – e aterrador – na vida de usuários de redes sociais é quando percebem que a tela do computador, tablet ou smartphone pode não proteger o seu anonimato, mesmo que ele use um nome falso. Outro momento é aquele em que eles descobrem que suas publicações podem ser distribuídas para o mundo inteiro, através de suas relações. Ou seja, qualquer coisa postada em rede social para o seu punhado de amigos ou seguidores será amplificado e chegará aonde não se imagina.

Considerando que o registro do que é publicado na internet não tem prazo de validade e pode ser, na maioria das vezes alcançado pelo Google, aquele conteúdo continuará disponível durante anos. E será levado em conta negativamente em um processo seletivo ou na análise de uma promoção, por exemplo.

Educação para a mídia – As pessoas ganharam acesso a meios de comunicação que podem atingir multidões, mas não sabem, necessariamente, lidar com eles, muito menos entender as consequências de suas intervenções. Seria ótimo contar com educação para a mídia, como já ocorre em algumas escolas, para que possamos entender não apenas as possibilidades, mas também os cuidados com a internet. Pois ela não significa um mundo à parte, mas outra camada de nossa vivência cotidiana.

Sabemos do hercúleo esforço de empresas para construir a credibilidade de suas marcas. Diante do risco de serem associadas à violência de gênero, à homofobia ou ao racismo, elas vêm preferindo repreender ou eliminar o fator causador do problema do que arcar com campanhas se justificando posteriormente. Problemas como empregados que usam a hora do expediente para pregar a violência sexual na internet, por exemplo.

Portanto, antes de postar algo de caráter duvidoso, pergunte-se: Eu teria coragam de gritar esse comentário em uma estação de trem lotada ou um teatro? Eu me importaria caso ele fosse destinado a mim? O que meu chefe, meus colegas de trabalho, amigos e familiares pensariam se eu dissesse isso a eles?

De acordo com a professora da FGV Direito SP, especialista em direitos humanos e coordenadora do Centro de Pesquisa Supremo em Pauta, Eloísa Machado, temos liberdade de expressão, mas também temos responsabilidade pelo que falamos. ”A Constituição garante a liberdade de expressão e impede a censura prévia. Mas isso não significa que os discursos não possam ser repreendidos. As ofensas podem ser combatida no âmbito penal e civil, com a reparação.”

Ou seja, em uma boa democracia, nenhum direito é absoluto – ele é limitado por outros direitos e pelos direitos dos outros. Você pode dizer o que quiser, mas a Justiça pode ser chamada a analisar e decidir se a pessoa que se sentiu ofendida por você tinha razão. Isso sem contar as implicações que não envolvem a Justiça, como a divulgação de conteúdos dos comentários e dos nomes de quem os postou em redes sociais. No final, a decisão é sua.

https://blogdosakamoto.blogosfera.uol.com.br/2017/10/04/o-que-acontece-quando-agressores-de-redes-sociais-sao-expostos-ao-publico/

Deixe uma resposta