Política

A direita e a esquerda na América Latina

Tempo de leitura: 6 min

Víctor Flores Olea – Naturalmente, neste retorno da direita na América Latina haverá a influência do governo de Donald Trump, que apoiará plenamente essa guinada, desde que essa signifique um menor contato dos nossos países com a China e a Rússia.

Uma das fórmulas de Donald Trump manter o controle dos países latino-americanos é, sem dúvida, os princípios defendidos pelo país desde que se lançou a chamada Doutrina Monroe, que já tem mais de mais de um século de eficiência para o império em sua missão de manter o status favorável aos seus interesses nesta parte do mundo – e esta foi a tarefa da recente turnê do secretário de Estado Rex Tillerson pela região.

Não é segredo para ninguém que que as ditaduras militares do século passado se impuseram na América Latina em nome de uma Guerra Fria que, embora bradando contra nomes como Fidel Castro ou Salvador Allende, tinha como resultado a contradição de um cruel bloqueio econômico à ilha, por um lado, e o apoio velado à feroz ditadura de Augusto Pinochet, por outro, além de outras ditaduras igualmente deploráveis, como as do Brasil, Uruguai, Argentina, Colômbia, etc. Em todos os casos, se recordamos bem, o principal pretexto dos Estados Unidos era o de um grande complô soviético que queria dominar todo o continente e que manipulava qualquer vestígio de vocação democrática em nossos países, tachando-os de simples derivados das intenções de controle russo, que não se debilitavam jamais.

Ao que parece, mesmo já não estando vigente o argumento do enfrentamento entre sistemas econômicos e políticos (o socialista e o capitalista), Donald Trump procurada reviver essa oposição, tentando criar uma nova Guerra Fria, e usa isso como um de seus argumentos para incrementar significativamente o orçamento militar, para preocupação dos seus concidadãos.

Trump pretende incorporar a China nessa mesma disputa, mas essa tentativa tem tornado o argumento mais pobre e cheio de contradições. Em primeiro lugar, porque os Estados Unidos são o país do mundo que tem mais dívida com a China, e também porque há um grande número de países latino-americanos, que gostariam de estabelecer relaciones económicas com a China – aliás, muitos já avançaram nessa direção, alcançando inclusive relações econômicas com o gigante asiático, em condições seguramente favoráveis. Essa parte do discurso de Trump, portanto, acaba ficando mais frágil e deixa evidente uma intenção meramente imperialista dos Estados Unidos, levada até os limites do absurdo pelo atual presidente.

A viagem do secretário Tillerson passou por cinco países latino-americanos. Em cada parada ele usou o mesmo script, insistiu no perigo de nossas relações com os países destrutores que estão aparecendo no horizonte, em clara referência a China e Rússia.

A verdade é que as relações entre os Estados Unidos e a América Latina enfrentam uma mudança profunda, já que as coordenadas de poder regional já não são automaticamente favoráveis aos norte-americanos, e agora se apresentam diversas vias como mecanismos alternativos de concertação política, de financiamento e cooperação nos campos econômico, político e cultural, precisamente com a China e com a Rússia.

“Os estadunidenses me elegeram para que fazer com que os Estados Unidos sejam grandes de novo”, é a frase que inicia um texto de Trump que, por momentos, beira o ridículo. Um dos trechos do documento está dedicado às relações com o hemisfério ocidental, especificamente com a América Latina, no qual adverte sobre a presença crescente da China e da Rússia, assim como de seu alarmante papel, e necessidade de fazer com que os governos da região cooperem mais com os Estados Unidos. “A América Latina não precisa de novos poderes imperiais”, afirma, sem perceber que estava confirmando plenamente a grande queixa da América Latina aos Estados Unidos, seu invariável proceder imperialista.

É verdade que o lugar dos Estados Unidos está muito longe de ser ocupado por esses países, por tantas razões que seria quase inútil repetir, mas o fato é que uma vez mais se mostra plenamente que a história tem um dinamismo permanente e que as mudanças são impossíveis de prever, e uma dessas imprecisões é a insatisfação das maiorias latino-americanas para com os Estados Unidos, que tantas vezes tem sido um obstáculo para nosso avançou econômico e democrático, o qual não sabemos ou simplesmente não podemos superar.

Talvez não seja fácil encontrar hoje movimentos que se opõem mais fortemente à nossa dependência do Norte, ou que proponham modificá-la, como em algum momento puderam fazer as revoluções Mexicana e Cubana, e o novo sistema bolivariano de Hugo Chávez. Hoje, entende-se que os políticos de esquerda que procuram a liberação a respeito da grande potência, buscam um gradualismo maior para alcançar seus fins. Entretanto, nada impede que se batalho por essa meta a partir de distintos ângulos e com diferentes táticas.

Estes são os tempos da liberação de nossas pátrias, segundo o escrito por alguns representantes da teologia da libertação. Estes são tempos em que a América Latina deve trabalhar unida para se livrar de seus opressores, que impuseram o neoliberalismo para privatizar a riqueza e socializar a pobreza. Hoje, nossas pátrias devem se integrar por decisão soberana e com a intenção de alcançar uma real independência, e estabelecer regimes igualitários, os devem acabar as abismais diferenças entre as classes sociais. A missão com certeza não é fácil, mas ainda é o farol que orienta as lutas latino-americanas.

Para vários observadores latino-americanos, a partir de 2014 se consolida uma verdadeira restauração conservadora. Para defender essa tese, mencionam frequentemente o acosso político e econômico contra a Venezuela, o golpe parlamentar no Brasil e a politização da Justiça, como demonstram os casos de Lula da Silva e Dilma Rousseff no Brasil, ou de Cristina Fernández na Argentina, ou o de Rafael Correa no Equador. A chegada de Mauricio Macri ao governo argentino, e a volta de Sebastián Piñera no Chile, seriam alguns dos mais notáveis sucessos da direita, embora o primeiro esteja convivendo agora com o repúdio da maior parte dos seus concidadãos.

Naturalmente, neste retorno da direita na América Latina, sobretudo no porvir imediato, haverá a influência do governo de Donald Trump, que apoiará plenamente essa guinada, desde que essa signifique um menor contato dos nossos países com a China e a Rússia. Viveremos tempos difíceis. Por isso a importância de uma possível vitória de Andrés Manuel López Obrador no México, ao menos como uma forma de restaurar certo equilíbrio internacional.

https://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Pelo-Mundo/A-direita-e-a-esquerda-na-America-Latina/6/39432

Deixe uma resposta