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A Agropecuária e a volta à Natureza

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Danton Leonel de Camargo Bini – As políticas neoliberais intensificadas nos anos 1990, ao reduzirem a atuação do Estado na elaboração de políticas de planejamento regional, abriram caminho para que as leis de mercado redefinissem o mapeamento dos circuitos espaciais de produção, circulação e distribuição dos setores da economia. A abertura comercial que facilitou a entrada de produtos importados no mercado nacional garantiu a permanência dos atores e das regiões mais competitivas. Reduziu-se a ocupação diversificada do solo pelas culturas agropecuárias nas regiões, o que acentuou a especialização produtiva do território usado e consequentemente a divisão territorial da produção e do trabalho. Intensificou-se o êxodo rural e a urbanização desordenada (que acrescidos pela flexibilização das leis trabalhistas) agravaram ainda mais a precariedade da condição humana no findar do século XX.

Em um patamar no qual a função da terra se manifesta hegemonicamente segundo os anseios do mercado verticalizado de commodities internacionais (como a cana-de-açúcar e a pecuária bovina de corte moderna), sua posse especulativa sustenta a manutenção de uma lógica perversa que coloca o abastecimento de alimentos dependente de longos circuitos espaciais de circulação. Reforça essa tendência, a insuficiência de políticas públicas que subsidiam as produções regionais (além da política de preços mínimos, do Programa de Aquisição de Alimentos – PAA e do Plano Nacional de Alimentação Escolar – PNAE) e invertam parte dos investimentos em ciência e tecnologia para a adaptação e o aumento da produtividade de culturas alimentares nos diferentes domínios morfoclimáticos.

Há tempos, no ensaio Natureza e Sociedade (1984), Rosa Ester Rossini já enfatizava que o alargamento das distâncias entre os seres humanos e a natureza somente estenderia, de maneira desatinada, suas necessidades em relação a ela. Posto isso, após o aprofundamento maléfico dos monocultivos durante a onda neoliberal, tornou-se premente a necessidade de se desalienar os usos locais do espaço geográfico, revalorizando a realidade concreta das políticas públicas regionais à serviço de suas populações.

É preciso assim ir além das deliberações pontuais que reorientam meramente porções pouco significativas da totalidade (como os assentamentos de reforma agrária) rumo à projetos geradores de segurança alimentar e nutricional para a população regional. Na busca de um futuro diferente, a tomada de consciência de que a realidade pode ser transformada por intermédio das escolhas, das decisões e das lutas, deixa em aberto as possibilidades de inversão dialética, na concretização de utopias e esperanças. Trata-se da criação de um novo mundo, no qual o reencontro da sociedade com a natureza se efetivará primordialmente por intermédio da reestruturação produtiva de toda agricultura numa solidariedade orgânica que garanta o acesso universal de todos os seres humanos a uma alimentação saudável.  Como já enfatizado em 1969 por Milton Santos na pesquisa De la geographie de la faim a la planification régionale, somente uma política de planejamento geral da economia que integre a população urbana e o entorno rural nas regiões agrícolas permitirá um redirecionamento efetivo do território usado ao que ele denominou posteriormente como o período popular da História.

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